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Choro: a música instrumental nas cidades do Brasil Colônia, a “Música de Barbeiros”


Choro: o primeiro gênero musical brasileiro tipicamente urbano. Quando falamos nele, logo pensamos em Pixinguinha, Jacob do Bandolim, Waldir Azevedo, Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth. Músicas de conhecimento intrínseco na história do brasileiro, como “Tico-tico no fubá” e “Carinhoso”, são exemplos de um choro naturalmente popular; mas quais foram os fatores determinantes para o choro se consolidar? Quando, como e com quem esse gênero musical começou?

Para respondermos a tais questões, faz-se necessário resgatar as músicas feitas pelos escravos negros — a chamada “Música de barbeiros”. Além disso, é indispensável entender a formação do moderno Rio de Janeiro, bem como os motivos que proporcionaram o surgimento de uma nova classe social que daria origem ao choro.

Em meados do século XVII, aparecia na Bahia e no Rio de Janeiro o primeiro tipo de música instrumental brasileira destinada ao lazer nas cidades; composta por escravos negros, ficou conhecida como “Música de Barbeiros”. Nas fazendas destes estados, os senhores destinavam alguns de seus escravos ao aprendizado de certas profissões, como por exemplo a de barbeiro. Estes escravos iam às cidades exercer o seu ofício e, por conta de tal profissão possuir relativa flexibilidade de tempo em virtude de seus aspectos liberais, dispunham de horas livres para o lazer. Logo, devido às habilidades manuais que estes homens detinham, além de que muitos apresentavam aptidão para tocar instrumentos, era na música que buscavam o seu divertimento das horas vagas.

A vinda destes escravos músicos paras as cidades aconteceu devido ao processo material de urbanização do Brasil colônia, que só pôde acontecer na Bahia e no Rio de Janeiro dinamizados pela corrida do ouro. Segundo o historiador José Ramos Tinhorão, Salvador foi de 21 mil habitantes em 1706 para 37 mil em 1755, e o Rio de Janeiro saltou de 30 mil em 1763 para 43 mil em 1799. Desta maneira, profissões como as de barbeiro passavam a ser inevitáveis para a vida citadina.

Estes músicos tinham como principal referência o lundu, gênero musical africano que dispõe da percussão como instrumental principal. Ademais tiravam as músicas de “orelha” e eram instruídos de acordo com a realidade material de sua classe social, e não por músicos eruditos oriundos das escolas europeias, nem tampouco por padres jesuítas. Por essas e outras, é possível afirmar que a música dos barbeiros tinha um caráter essencialmente popular, uma vez que tais músicos dispunham de mestres de sua própria condição, isto é, mestres e professores pertencentes a sua classe social.

Por conseguinte, a “trilha sonora” do Brasil colônia era o “ritmo de senzala” (assim nomeado pelos brancos); o ritmo negro-africano a base de percussão fazia as festas dos santos cristãos europeus, além das festas de São João e principalmente a do Divino Espírito Santo. Tais conjuntos também eram chamados de “charangas” ou “terno de barbeiros”. Tinhorão detectara em Manuel Antônio de Almeida, em seu “Memórias de um Sargento de Milícias”, alguns registros de informações sobre os barbeiros músicos: “Dispuseram-se as coisas; postou-se a música de barbeiros na porta da igreja; andou tudo em rebuliço: às 9 horas começou a festa”. Vale dizer que o instrumental a base de percussão ocorria por uma razão de ordem econômica, afinal os instrumentos de sopros e cordas eram reservados ao poderio econômico das elites brancas. Foi somente nos últimos anos da escravidão que os barbeiros começaram a introduzir de fato as cordas e os sopros — antes disso dependiam dos instrumentos dessa ordem que eram descartados pelas bandas militares. Tinhorão disserta que “os barbeiros tocavam flauta, cavaquinho ou rabeca, o que confirmava a evolução de tais conjuntos de música barulhenta das bandas para a música intimista dos choros, nascidos exatamente a base de flauta, violão e cavaquinho, quando morria a música de barbeiros” (TINHORÃO,1997, p.130). Verificamos aí uma tese de evolução da cultura “chorística”.

Desta maneira, torna-se fácil depreender que as músicas dos escravos negros contribuíram para o que veio a ser o choro. O choro, em sua gênese, nada mais era do que um estilo de tocar as músicas em voga, porém de maneira “chorada”. Assim, também é possível verificar um encadeamento de contribuições musicais que subsidiaram a futura música popular brasileira; a música negro-africana contribuiu originalmente para este processo, haja vista que “nas fazendas foram as bandas de escravos os avós das atuais liras do interior [...] na cidade do Rio de Janeiro foi a música de barbeiros mãe do choro, avó do regional profissional do rádio e bisavó dos conjuntos de bossa”, como Tinhorão assevera cirurgicamente.

Devido ao avanço da modernização das cidades do circuito do café e a abolição da escravatura no Brasil em 1888, seguidas por um golpe civil-militar conduzido pelas classes dominantes influenciadas pelos lemas positivistas, foi instaurada a República no Brasil, em 1889. Consequentemente houve um avanço das forças produtivas e uma mudança nas relações sociais de produção — a exploração do trabalho passava a ser assalariada com mão de obra barata, e não mais escravizada. Todo este processo fez com que a música dos escravos barbeiros caducasse, passando o seu “ritmo de senzala” para a pequena burguesia e o proletariado urbano do Rio de Janeiro. Seriam estes mestiços dos pagodes cariocas (operários das primeiras fábricas, pequenos comerciantes, funcionários públicos, etc.) que fixariam os instrumentos a base de flauta, cavaquinho e oficlide, aderindo mais tarde o violão. Logo, formariam os primeiros conjuntos de choro.

Por Caio V. Z. Orru

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, M. A. de. Memórias de um Sargento de Milícias. São Paulo: Panda Books, 2015.

DINIZ, A. Almanaque do choro: a história do chorinho, o que ouvir, o que ler, onde curtir. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.

PINTO, A. G. O choro: reminiscências dos chorões antigos. Rio de Janeiro: Arcari Records, 3.ed., 2014.

TINHORÃO, J. R. Música Popular: um tema em debate. São Paulo: editora 34, 3. ed., 1997.

__________. História Social da Música Popular Brasileira. São Paulo: editora 34, 2. ed., 2010.

VASCONCELOS, A. Carinho Etc.: História e Inventário do Choro. Rio de Janeiro: Gráfica editora do livro, 1984.

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