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"Etiópia: novas guerras em velhas frentes"

  • Foto do escritor: NOVACULTURA.info
    NOVACULTURA.info
  • 14 de abr.
  • 5 min de leitura

 

A longa história da Etiópia está repleta de guerras de todos os tipos: anticolonialistas, de libertação, de secessão e múltiplos conflitos civis, regionais e tribais. Fiel a essa história, aquelas velhas frentes de combate ameaçam, mais uma vez, reacender, tanto dentro do país quanto em suas fronteiras.

 

Após mais de dois anos do fim da guerra civil entre o governo federal e a Frente de Libertação Popular de Tigray (TPLF) (2020–2022), que deixou cerca de um milhão de mortos, mais uma vez esse fantasma separatista ameaça se materializar.

 

A decisão de Abiy Ahmed, o primeiro-ministro da Etiópia, anunciada no último dia 26, de nomear um novo presidente e estender o mandato da Administração Provisória de Tigray (TIA), foi tomada devido aos atrasos na implementação de vários objetivos estabelecidos nos Acordos de Pretória (África do Sul), que puseram fim à guerra civil em novembro de 2022.

 

O agora ex-presidente da TIA, Getachew Reda, foi criticado pelo atraso na elaboração de um cronograma para a eleição das autoridades regionais. Soma-se a isso a perigosa demora no processo de desarmamento, desmobilização e reintegração dos milicianos locais, o que aumenta o risco de um novo conflito.

 

A extensão de um ano do mandato da TIA e o nome de um novo presidente para o executivo regional não foi nada bem recebida pelo histórico líder da TPLF, Debretsion Gebremichael, que estava no comando do governo regional quando o conflito começou, em novembro de 2020, e permaneceu no poder até os acordos de Pretória.

 

Gebremichael, que ainda mantém forte influência em Tigray e continua promovendo a ideia secessionista, havia feito duras críticas a Reda, seu ex-vice e principal negociador na África do Sul, bem como ao primeiro-ministro Abiy Ahmed.

 

No comunicado, Adis Abeba informou que a decisão do primeiro-ministro se baseia no fato de que o governo interino de Tigray “está há dois anos em funções, sem atingir os objetivos estabelecidos”, e novamente mergulhado em disputas internas, o que afasta as possibilidades de institucionalização e pacificação da região.

 

Ahmed já havia alertado o Parlamento de que “alguns indivíduos de Tigray poderiam tentar gerar um novo conflito contra o governo federal”, aproveitando a situação em regiões como a de Amhara, onde a insurgência do FANO – que havia sido aliada do governo central durante a guerra civil, mas rompeu com Adis Abeba há mais de um ano – agora ataca tropas das Forças de Defesa Nacional da Etiópia e alvos federais. A nova insurgência causou uma crise humanitária que afetou quase 80 mil pessoas nos distritos de Bugna e Lasta, forçando cerca de 10 mil a fugirem dos combates.

 

Também em Oromia – região natal de Abiy Ahmed e onde está localizada Adis Abeba – observa-se um aumento nas ações armadas contra as Forças de Defesa Nacional da Etiópia.

 

Entre os dias 11 e 12 de março, apoiadores de Gebremichael tomaram a prefeitura e outros edifícios governamentais da cidade de Mekele, capital regional, a emissora de rádio local e outras localidades fronteiriças com a Eritreia, incluindo partes do distrito de Seharti e Adigrat, o segundo maior centro populacional de Tigray.

 

Isso representou um “golpe de Estado” contra Reda e provocou a reação do governo federal, colocando o país à beira da reativação do conflito — no qual também há interesses de países como Sudão e Egito, devido à ativação da Grande Represa do Renascimento Etíope (GERD), que já está reduzindo o fluxo de água para o Nilo.

 

A Etiópia é o país sem saída para o mar mais populoso do mundo, o que a obriga a pagar altos custos para seu comércio exterior por meio dos portos de Djibuti, principalmente, embora também utilize portos somalis e quenianos, percorrendo distâncias de 600 a 1.300 quilômetros.

 

Essa situação levou Ahmed a assinar, no início de janeiro de 2024, um memorando de entendimento com a Somalilândia – região rebelde da Somália – à qual reconheceu oficialmente, tornando-se o primeiro país africano a fazê-lo. O acordo inclui benefícios econômicos em troca do arrendamento, por 50 anos, de uma faixa de 20 km no Golfo de Áden, na região de Berbera, para ser usada como base militar e porto comercial, uma área que já conta com fortes investimentos dos Emirados Árabes Unidos. (Ver: Egito-Etiópia: a guerra pelo Nilo). O arranjo levou Mogadíscio a iniciar rapidamente um conflito armado com Adis Abeba, contido apenas pela intervenção da Turquia, que conseguiu anular o memorando.

 

Por sua vez, a Eritreia apoia as forças de Amhara para manter o controle sobre os territórios anexados a Tigray durante a guerra civil. Esse cenário deteriorou significativamente as relações entre Asmara e Adis Abeba.

 

É importante lembrar que a retomada das relações diplomáticas entre Eritreia e Etiópia em 2019 foi o que levou à concessão do Prêmio Nobel da Paz a Abiy Ahmed naquele ano, após o acordo com o presidente eritreu Isaias Afwerki para encerrar a guerra fronteiriça que, embora travada entre 1998 e 2000, permaneceu latente por duas décadas.

 

Um lugar no Mar Vermelho

 

Embora ainda existam pendências entre Adis Abeba e Asmara após a guerra de Tigray – na qual a Eritreia, apesar de combater ao lado das forças federais, foi acusada de extrema violência contra a população civil tigrínia –, o foco atual do conflito não são as violações de direitos humanos, mas sim a possível intenção de Adis Abeba de recuperar o acesso ao Mar Vermelho, ocupando militarmente a área do porto de Assab, perdida durante a guerra de independência da Eritreia em 1993.

 

Em uma recente cúpula da União Africana (UA), realizada em Adis Abeba, foram apresentados mapas da Etiópia que já incluíam o porto de Assab, o que acendeu o alerta em Asmara. A imprensa dos dois países fala sobre um possível conflito iminente, enquanto diplomatas etíopes e eritreus realizam visitas a diversos países do Chifre da África e regiões próximas para defender suas posições.

 

O primeiro-ministro Abiy Ahmed declarou publicamente que não tem a intenção de invadir seus vizinhos do norte, com quem compartilha uma fronteira de mais de mil quilômetros e uma relação milenar complexa.

 

Ainda assim, e apesar das declarações de Ahmed, Asmara se prepara para o pior. Desde fevereiro, o presidente Afwerki ordenou a mobilização de todos os cidadãos com menos de 60 anos para treinamentos e prática militar. Eritreia é um estado altamente militarizado, nos moldes de Israel, onde praticamente toda a população passou anos no serviço militar. A decisão urgente inclui as mulheres, até mesmo casadas e com filhos. Além disso, as últimas ordens de Asmara proíbem a saída do país de cidadãos com menos de 50 anos.

 

O governo do presidente Isaias Afwerki considera provocação o fato de a Etiópia ter promovido, em janeiro, uma importante conferência do grupo Brigada N'hamedu (Revolução Azul), fundado em 2022 por exilados eritreus na Europa com o objetivo de derrubar seu governo.

 

Ahmed e Afwerki têm muitos recursos para instigar conflitos no território um do outro, reacendendo novas guerras em frentes já conhecidas.

 

Por Guadi Calvo, no Línea Internacional

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