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Acerca do debate no Partido Comunista do Brasil (PCB) sobre a questão agrária


O V Congresso Nacional do Partido Comunista do Brasil (PCB), realizado entre 28 de agosto a 6 de setembro de 1960, na sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no Rio de Janeiro, é - de certa maneira - um divisor de águas dentro do movimento comunista brasileiro que levaria à cisão dos comunistas dois anos depois. A batalha interna se dava em torno das concepções revisionistas da Declaração de Março de 1958, um documento que viria oficializar a adesão do PCB às posições oportunistas do dirigente soviético Nikita Kruschióv. As ideias centrais de defesa da revolução pacífica e via parlamentar para o socialismo, bem como a ilusão em considerar a burguesia como uma classe revolucionária tomaram conta do Comitê Central do Partido capitaneado por Prestes e que tinha em seu núcleo outros dirigentes como Jacob Gorender, Carlos Marighella, Mário Alves e Giocondo Dias. Outra questão que seria pontual no V Congresso e que vinha como linha política a ser adotada pelo Partido era a questão teórica sobre a revolução brasileira. Desde a Declaração de Março, o PCB abandonara a sua linha política aprovada no IV Congresso e que considerava central a defesa de uma Frente Democrática e Antiimperialista contra os resquícios feudais na nossa formação econômica e que impediam o desenvolvimento brasileiro.

O embate em torno destas questões teóricas sobre o caráter da revolução brasileira colocava de um lado o dirigente paulista Caio Prado Júnior, um dos que mais combatia as Teses sobre os resquícios feudais na formação econômica do campo brasileiro; e, por outro lado, as Teses sobre os resquícios feudais defendidas por outro grande dirigente e teórico: Alberto Passos Guimarães. Esta discussão foi realizada com grande amplitude durante a Tribuna de Debates do V Congresso, onde Alberto Passos Guimarães destacava (com o artigo As três fontes da luta de classes no campo brasileiro) que o campo no Brasil ainda necessitava de profundas reformas, inclusive reformas do ponto de vista capitalistas. Neste artigo, Guimarães, recorrendo a Lênin, diz que “o livre desenvolvimento da luta de classes ‘é o ponto fundamental e central da teoria do marxismo revolucionário na questão agrária’” (Lênin em O programa agrário da socialdemocracia russa). Para Guimarães, a condição objetiva para a realização das transformações sociais no Brasil semifeudal, deveriam ser hegemonizadas pelo proletariado e seus aliados [1] e eram de caráter burguês ou seguindo o modelo de “desenvolvimento capitalista”.

O latifúndio no Brasil, ligado diretamente às sesmarias (estas que eram resquícios do feudalismo português), usava de violência contra a massa de camponeses despossuídos e explorados e ditava o curso reformista, contra transformações burguesas no campo (principalmente a criação do mercado consumidor interno que seria fruto da divisão capitalista da terra, a reforma agrária).

Já Caio Prado Jr., em seu artigo A revolução brasileira (que viraria um importante livro anos depois) dizia claramente: “não existem restos semifeudais ou pré-capitalistas nas relações de produção no campo”. Para Prado Jr., o Brasil era um país já capitalista e, simultaneamente, dependente [2], atrasado ou subdesenvolvido. Existiam fortes contradições nesta Tese defendida por Prado Jr., como por exemplo: ele não considerava o monopólio da terra pelos latifundiários que barravam uma reforma agrária que permitisse a penetração do capitalismo no campo brasileiro.

O Partido Comunista do Brasil (PCB), ainda neste V Congresso (em 1960), oficialmente defendia que “o caráter da revolução brasileira na atual etapa histórica é antifeudal, antilatifundiária e antiimperialista, visa remover não a propriedade privada, mas sim o monopólio da terra e destituição não da burguesia rural como classe dominante, mas sim dos latifundiários”.

Aos poucos, principalmente após a cisão que reorganizou o Partido Comunista do Brasil em 1962, o movimento comunista brasileiro e o debate sobre o caráter do campo brasileiro foi diminuindo. A Ditadura Militar foi imposta a partir de 1964 e o latifúndio só aumentou, crescendo as contradições no campo e ganhando ainda mais poder de decisão na política brasileira. Hoje, a chamada bancada do boi, ruralista, ligada ao chamado agronegócio, agrega poderes antes nunca vistos no Brasil republicano. As reformas de caráter democrático ainda continuam válidas para modernizar o campo e quebrar o monopólio da terra, criando um mercado consumidor interno poderoso e estruturando o crescimento industrial do Brasil.

Escrito por Clóvis Manfrini

Notas

[1] Alberto Passos Guimarães: “O proletariado e as forças mais progressistas da sociedade brasileira devem apoiar as transformações burguesas no campo que resultem na destruição dos laços com o feudalismo, que resultem na destruição das forças pré-capitalistas, e expressem um desenvolvimento democrático apoiado no capitalismo de Estado (grifo nosso) e na propriedade camponesa”. Ver a coleção de seis volumes A Questão Agrária no Brasil, organizada pelo dirigente do MST, João Pedro Stédile, disponível em http://www.reformaagrariaemdados.org.br/biblioteca/livro/quest%C3%A3o-agr%C3%A1ria-no-brasil-vol-1-o-debate-tradicional-1500-1960.

[2] É a mesma Tese seguida e desenvolvida anos depois pelo sociólogo marxista Florestan Fernandes.

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