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"Os marxistas e a Questão Palestina"

Foto do escritor: NOVACULTURA.infoNOVACULTURA.info
Ilustração de poster da FPLP

A Questão Palestina sempre despertou o interesse de intelectuais e organizações de orientação marxista, pois a luta entre as potências capitalistas europeias e o Império Turco-Otomano pelo controle desse território ocorre num período de expansão do capital industrial e financeiro para o chamado “Oriente Médio” e para a Ásia. Expansionismo, militarismo e guerras de conquista são características típicas da fase imperialista do capitalismo, que produz uma desigualdade entre as nações e impõe uma desigual Divisão Internacional do Trabalho. Longe de promover uma situação homogênea no campo das relações internacionais, o processo de internacionalização do capital e do capitalismo tem como resultado a produção de inúmeros conflitos regionais cujo centro da disputa é a definição das fronteiras nacionais, o estabelecimento de novas nações que atendam interesses de nacionalidades oprimidas ou a luta pela independência e soberania. Portanto, diversas lutas nacionais, nacionalistas, anticolonialistas e anti-imperialistas se desenvolvem, surgem e se multiplicam durante os séculos XIX e XX. E é nesse contexto que a Palestina, por vários motivos, adquire importância estratégica para os projetos políticos da classe dominante da Europa e do Mundo Árabe.

 

A análise marxista da situação concreta da Palestina sempre exigiu a combinação de alguns elementos fundamentais: 1. Reconhecer que a libertação nacional aparece como reivindicação prioritária nas lutas desse povo; 2. Realizar um esforço para identificar os interesses de classe presentes no dia-a-dia do intenso movimento da resistência nacional palestina; 3. Tentar compreender quais são e como pensam e atuam as organizações marxistas e de esquerda no interior do movimento da resistência nacional palestina, suas ideias principais, seu programa, suas táticas, etc.

 

As origens do conflito atual: sionismo e imperialismo invadem a Palestina

 

A Palestina é um território de 27.000 km2 que se localiza entre o Egito, Líbano, Síria e Jordânia, tendo um vasto litoral com saída para o Mar Mediterrâneo. Pelo sul da Palestina chega-se ao Golfo de Ácaba, que levará qualquer navegante ao Mar Vermelho, Golfo de Áden, Mar da Arábia, Golfo de Omã e Oceano Índico. Do ponto de vista econômico, político e militar, sua localização é estratégica. A Palestina fica no centro do mundo, na divisa entre a África e a Ásia, e bem próxima da Europa. Por isso tal território sempre foi alvo de invasões ao longo de sua história. A região também sempre foi importante rota comercial terrestre e marítima. Durante o final do século XIX a Palestina estava sob o domínio do Império Turco-Otomano. Na Europa e na Rússia cresce o número e a força de grupos que perseguiam os judeus (“pogroms”). Também nesse período surge um movimento nacionalista judaico chamado Sionismo, que adota esse nome em referência a uma colina de Jerusalém (Sion) onde havia sido construído o Templo de Salomão.

 

Um dos fundadores do movimento sionista foi Theodor Herzl (1869-1904). Herzl nasceu em Budapeste e estudou em Viena, duas cidades importantes do então Império Austro-Húngaro. Vinha de uma família de banqueiros, e elaborou sua concepção nacionalista judaica num livro chamado O Estado Judeu, publicado em 1896. Em 1897, Herzl e outros adeptos do Sionismo se reúnem no I Congresso Sionista, em Basiléia, na Suíça. A resolução final do Congresso falava da criação de um “lar nacional para os judeus”, algo que já estava presente no livro de Herzl, apontando a Argentina ou a Palestina como os locais mais favoráveis para a realização de tal empreendimento. A partir daí os sionistas correram o mundo para angariar recursos financeiros e apoio político para sua proposta. Herzl e seus seguidores vão estabelecer contatos com os governos da Inglaterra, da Alemanha, com o Império Turco-Otomano, com banqueiros, industriais e comerciantes judeus e não-judeus, visando fortalecer a ideia da necessidade de um Estado Judeu. A comunidade judaica europeia se divide, e nem todos apoiam a ideia sionista, mas esse movimento consegue o apoio da burguesia judaica e de setores importantes da burguesia não-judaica europeia. Em seu livro Herzl já afirmava sua preferência pela Palestina, que chamava de “pátria histórica” dos judeus, e dizia que o Estado Judeu seria “para a Europa, um pedaço de fortaleza contra a Ásia, seríamos a sentinela avançada da civilização contra a barbárie” (O Estado Judeu, 1998: p.66). Tal afirmação comprova o vínculo entre sionismo e imperialismo, pois o objetivo de Herzl era obter o apoio das potências imperialistas que dominavam o mundo, e em especial o Oriente Médio, para que a Palestina fosse entregue à burguesia judaica, para que a mesma transformasse esse território numa fortaleza militar contra o avanço do nacionalismo árabe e de possíveis movimentos antiimperialistas que cresciam no Oriente Médio do período pós-Primeira Guerra Mundial. Segundo o intelectual marxista estadunidense Ralph Schoenman, “O que distingue o movimento sionista dos demais movimentos coloniais é a relação entre os colonos e o povo a ser conquistado. O movimento sionista tem como objetivo declarado não somente explorar o povo palestino, mas também dispersá-lo e expropriá-lo. A intenção era substituir a população nativa por uma nova comunidade de colonos, expulsar os camponeses, os artesãos e a população urbana da Palestina e substituí-los por uma força de trabalho completamente formada por colonos (…) Ao negar a existência do povo palestino, o sionismo pretendia criar o clima político para expulsá-lo não somente de sua terra, mas também da história” (Schoenman, 2008; p. 47).

 

Com a derrota do Império Turco-Otomano na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), França e Inglaterra invadem o Oriente Médio e dividem entre si a região, ficando a Palestina sob o domínio britânico de 1918 a 1948. Nesse período o movimento sionista está consolidado, e sua ambição de construir um “lar nacional para os judeus” na Palestina ganha ainda mais apoio, devido ao massacre de judeus pelos nazistas na Europa da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Criam-se, então, as condições favoráveis para a realização da profecia que Herzl e seus seguidores elaboraram em 1897: criar o “Estado Judeu” em cinqüenta anos. Durante vários séculos os judeus haviam passado por um processo de assimilação, ou seja, haviam se integrado na comunidade nacional de vários países. Trabalhavam, estudavam, participavam da vida política, econômica, social e cultural de onde viviam, e muitos também se envolviam nas lutas por justiça, democracia, igualdade e em defesa dos trabalhadores contra a exploração do capital e do capitalismo. O movimento Sionista divide a comunidade judaica e vai iniciar uma propaganda em defesa de um nacionalismo burguês conservador e com um conteúdo racista e antidemocrático. Basta ver a proposta de organização política do Estado Judeu defendida por Herzl. Diz ele: “Considero a monarquia democrática e a república aristocrática como as mais belas instituições políticas (…) Sou amigo convencido das instituições monárquicas porque elas tornam possível uma política permanente e representam o interesse ligado a conservação do Estado de uma família historicamente ilustre, nascida e educada para reinar (HERZL, 1998: p.111 e 112)”. Sua posição elitista e antidemocrática considera “o referendum como absurdo, pois, em política, não há questões simples que possamos resolver por um sim ou por um não. Aliás, as massas são ainda piores do que os parlamentos (grifo nosso) (…) Diante de um povo reunido, não podemos fazer nem política exterior nem política interior (…) A política deve ser feita do alto” (Idem, p.112).

 

Essa ideologia conservadora serviu de base para a instauração do Estado de Israel. Para os marxistas, compreender o conteúdo racista e conservador do sionismo é fundamental para que possamos explicar a posição atual do governo de Israel em relação ao povo palestino. Três ideias foram fundamentais para convencer milhares de judeus a emigrar para a Palestina: 1) que a Palestina era uma “terra sem povo” e os judeus eram um “povo sem terra”; 2) que a Palestina é a “pátria histórica” dos judeus; 3) que os judeus são o “povo eleito” por Deus. Essas ideias fizeram com que banqueiros e grandes empresários judeus contribuíssem para a criação da Companhia Judaica, empresa de colonização com o objetivo de comprar terras para instalar colônias judaicas na Palestina. Durante os anos 20 e 30 do século XX o crescimento dessas colônias deu início a uma série de conflitos entre judeus sionistas e árabes-palestinos. Nos anos 40 o movimento sionista começa a organizar grupos terroristas como o Irgun, Stern e Haganah, que fazem ações armadas e atentados contra a população árabe-palestina, com a intenção de intimidá-los através da violência, fazer com que abandonem seus lares, suas propriedades e suas aldeias. O Sionismo se organiza de três maneiras: 1) politicamente: através de várias organizações nacionais e internacionais que visam buscar apoio político de governos para seu projeto colonialista; 2) economicamente: buscando recursos financeiros de empresários e banqueiros judeus e não-judeus para a instalação de colônias na Palestina; 3) militarmente: organizando grupos terroristas/paramilitares para espalhar o pânico entre a população árabe-palestina, grupos que, depois de 1948, se transformam nas Forças Armadas de Israel; 4) culturalmente: através da difusão, pela indústria cultural, de ideias que buscam justificar a dominação territorial da Palestina e o direito “histórico e sagrado dos judeus” de ocupar aquela região[1].

 

Em 1947, como resultado de uma articulação política internacional dirigida por representantes das potências imperialistas (EUA, Inglaterra e França) e do sionismo internacional, e com o apoio da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e das recém criadas “repúblicas socialistas” do Leste Europeu, a Organização das Nações Unidas (ONU) aprova a Partilha da Palestina, que deveria criar naquela região dois Estados, um Judeu e um Palestino. O Estado Judeu ficaria com 56,4% do território, o Estado Palestino ficaria com 42,9%, e 0,7%, correspondente à cidade de Jerusalém, seria administrado pela ONU, por ser local sagrado para cristãos, judeus e muçulmanos. Além de receber a maior parte do território palestino, o Estado Judeu ficou com as terras mais férteis. No ano da partilha (1947), a população árabe-palestina era maioria absoluta em 15 dos 16 subdistritos existentes. Somente em Jaffá a maioria da população era formada por judeus. Eram 1.310.000 de árabes-palestinos-muçulmanos e 630.000 judeus. Quem coordenou a votação na Assembleia Geral da ONU foi o diplomata brasileiro Oswaldo Aranha, ex-Ministro das Relações Exteriores. Orientado pelo governo brasileiro para acompanhar o voto dos EUA, Aranha adiou por dois dias a votação, para que o lobby sionista e estadunidense pudessem convencer outros países sobre a necessidade da criação do Estado Judeu. No dia 29 de novembro de 1947 a votação foi a seguinte: Favoráveis: África do Sul, Austrália, Bélgica, Bolívia, Brasil, Bielo-Rússia, Canadá, Costa Rica, Checoslováquia, Dinamarca, Equador, Estados Unidos, Filipinas, França, Guatemala, Haiti, Holanda, Islândia, Libéria, Luxemburgo, Nicarágua, Noruega, Nova Zelândia, Panamá, Paraguai, Peru, Polônia, República Dominicana, Suécia, Ucrânia, União Soviética, Uruguai e Venezuela. Contra: Afeganistão, Arábia Saudita, Cuba, Egito, Grécia, Iêmen, Índia, Irã, Iraque, Líbano, Paquistão, Síria e Turquia. Abstenções: Argentina, Chile, China, Colômbia, El Salvador, Etiópia, Honduras, Iugoslávia, México, Reino Unido. (GATTAZ, 2002, p. 94 e 95).

 

Em 14 de maio de 1948 os britânicos deixam a Palestina e é fundado o Estado de Israel. Desde os primeiros dias de sua existência, o governo sionista impediu a criação do Estado Palestino, desrespeitando com isso a resolução 181 da ONU, que previa a constituição de dois Estados. Tem início a Guerra da Palestina, onde de um lado está o Exército Sionista-Colonialista de Israel e, de outro, a população palestina, que desde esta época luta pela sua libertação, pela criação de um Estado Laico e Democrático, onde possam viver em paz judeus, cristãos e muçulmanos, onde seja garantido aos indivíduos o direito de decidir e manifestar livremente suas posições políticas e/ou religiosas. Portanto, desde 1948 o povo palestino vive uma tragédia: foram expulsos de suas terras e de suas casas, e tiveram suas propriedades roubadas ou destruídas pelo chamado Exército de Defesa de Israel. Vilas e cidades palestinas vêm sendo constantemente destruídas durante os 64 anos da Nakba (“A tragédia”). Milhares de pessoas seguiram o caminho do exílio e os refugiados palestinos já chegam a 5 milhões. E, ainda assim, milhares seguem resistindo dentro dos territórios ocupados por Israel.

 

Em 1967, o expansionismo israelense se intensifica. Novas colônias e assentamentos judeus-sionistas são criados em Gaza, Cisjordânia e Jerusalém, agora tomada militarmente pelo exército colonialista, em mais um desrespeito às resoluções da ONU sobre a questão palestina. Além disso, Israel ocupa militarmente as Colinas de Golan, que são da Síria, e a Península do Sinai, do Egito. A única resolução da ONU que Israel respeitou até o momento foi a da sua própria criação.

 

A Organização para a Libertação da Palestina (OLP) enquanto principal instrumento da resistência: a ofensiva contra o sionismo (1964/1988)

 

A resistência palestina já desenvolveu as mais diversas formas de luta. Mas foi nos anos sessenta e setenta do século XX que o movimento de libertação nacional palestino adquiriu importância internacional, conquistando espaços junto a organismos internacionais, governos e representações diplomáticas de vários países, sendo apoiado pela maioria do bloco de países socialistas do Leste Europeu (Alemanha Oriental, Polônia, Hungria, Bulgária, Tchecoslováquia, Iugoslávia, Romênia), pela Albânia, pela China, pelo Vietnã, pela Coréia do Norte, pela URSS, pelo Movimento dos Países Não-Alinhados[2], pela Organização de Unidade Africana (OUA) e pela Liga Árabe[3]. Todo esse apoio internacional à causa palestina produziu inúmeras resoluções da ONU e condenações ao Estado de Israel, e gerou uma conjuntura favorável para que a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) fosse convidada a falar na Assembléia Geral da ONU em 1974, quando Yasser Arafat fez um discurso histórico para um plenário majoritariamente a favor do cumprimento das várias resoluções sobre a Questão Palestina. Arafat afirmava que “O mundo necessita de esforços tremendos para que se realize as suas aspirações de paz, liberdade, justiça, igualdade e desenvolvimento para que a sua luta seja vitoriosa contra o colonialismo, imperialismo, neocolonialismo e racismo em todas as suas formas, inclusive o sionismo (…) Nossa revolução é também para os judeus, como seres humanos. Lutamos para que judeus, cristãos e muçulmanos possam viver em igualdade, gozando os mesmos direitos e assumindo as mesmas responsabilidades, livres da discriminação racial e religiosa (…) Sou um rebelde e a liberdade é a minha causa. Bem sei que muitos dos presentes aqui hoje se ergueram na mesma posição de resistência que ocupo hoje e de onde devo lutar. Um dia vocês tiveram que converter sonhos em realidade em sua luta. Portanto, agora vocês devem compartilhar o meu sonho, o nosso sonho de um futuro de paz na terra sagrada da Palestina (…) Apelo a todos vocês que permitam que o nosso povo estabeleça soberania nacional independente sobre a sua própria terra. Hoje eu venho portando um galho de oliveira e uma arma dos lutadores pela liberdade. Não permitam que o galho de oliveira caia de minha mão” (…) (ARAFAT, 2007, p. 87, 105 e 107.)

 

Em novembro de 1974 a resolução da ONU 3237 convida a OLP para participar, na condição de observadora, dos trabalhos e sessões da Assembleia Geral, se transformando numa imensa vitória diplomática daquela que seria reconhecida como a única e legítima representante do povo palestino. Entre 1964 e 1988, a OLP conduziu o processo de mobilização anticolonialista e desencadeou uma incrível luta de libertação nacional que deu esperanças para as massas populares de todo o mundo árabe. Criada pela Liga Árabe, a OLP vai adquirindo autonomia/independência deste organismo, até conquistar plenamente o direito de decidir sobre muitas questões relacionadas à luta palestina sem consultar e/ou concordar com as posições dos governos de países árabes. Essa maior autonomia ampliou o apoio e garantiu mais legitimidade da OLP entre a classe trabalhadora e as massas populares palestinas e árabes. Enquanto uma frente de cerca de 10 partidos políticos (nacionalistas laicos/nasseristas[4] e comunistas/socialistas), a OLP seguia como a única e legítima representante do povo palestino.

 

A estrutura política e organizativa da OLP: uma frente política formada por nacionalistas laicos e marxistas/comunistas/socialistas

 

Nossa opção em dar um destaque à OLP se justifica devido ao fato de que, apesar das contradições, conflitos e problemas internos existentes desde sua origem, ela se tornou, sem dúvida nenhuma, na única e legítima representante do povo palestino durante o mais longo período de resistência política, popular e militar contra a ocupação israelense. Entre 1964 e 1988 podemos afirmar com bastante contundência que não havia no interior do povo palestino nenhuma outra organização com tanto prestígio, influência e capacidade de combate como foi a OLP[5]. Principalmente entre 1969 e 1988 foram muitas as demonstrações de força deste importante instrumento político da luta palestina que, se utilizando do direito legítimo à resistência contra a ocupação de sua pátria por uma força militar estrangeira, conquistou o apoio e a solidariedade de amplas camadas da população mundial. Sem dúvida é a organização política mais antiga e mais importante na história do movimento de libertação nacional palestino.

 

Desde sua criação um dos espaços decisivos da OLP tem sido o Conselho Nacional Palestino (CNP), cuja obrigação era a de se reunir pelo menos uma vez por ano para tratar dos temas fundamentais da luta contra a ocupação israelense, fazer uma reflexão sobre a conjuntura política nacional, regional e internacional, e elaborar as orientações para as distintas organizações que fazem parte do movimento de libertação nacional palestino. A composição do CNP era dividida em quatro categorias: organizações político-militares, organizações de massa/populares, representantes das comunidades palestinas (nos países árabes e em outras partes do mundo, nos campos de refugiados – Jordânia, Estados do Golfo, Líbano, Síria, Arábia Saudita, Egito -, tribos beduínas e delegados independentes) e Exército Palestino de Libertação Nacional (EPLN). No início dos anos oitenta os cerca de 430 membros do CNP representavam as seguintes organizações: 1. organizações político-militares (83 delegados – 19,3%): Al-Fatah (Movimento de Libertação Nacional), Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP), Frente Democrática para a Libertação Palestina (FDLP), Saika e Frente Árabe de Libertação (FAL); 2. organizações de massa/populares (112 delegados – 26%): associações, confederações e sindicatos de trabalhadores; 3. representantes das comunidades palestinas (191 delegados – 44,4%) e 4. Exército Palestino de Libertação Nacional (44 delegados – 10,3%) (MUSSALAM; 1987, p. 22 e 23).

 

Neste período de construção, fortalecimento e ofensiva da OLP as sessões aconteceram em: Jerusalém/Palestina (28 de maio de 1964): foi a reunião de fundação da OLP, onde foram aprovadas a Carta Nacional Palestina e a Carta de Princípios da OLP. Ahmed Chukeiry é indicado pela Liga Árabe como presidente da OLP; Cairo/Egito (1965): uma das principais discussões foi a necessidade de aproximação da OLP com as demais organizações revolucionárias palestina, visando a unificação da resistência; Gaza/Palestina (1966):  neste ano foi criado um Comitê para coordenar as ações das várias organizações palestinas na luta contra o governo do Estado de Israel; Cairo/Egito (1968): A guerra de junho de 1967, que resultou na ocupação israelense de Gaza, Cisjordânia, Jerusalém, Colinas de Golan (da Síria) e Península do Sinai (do Egito) e problemas internos na OLP impedem a realização da sessão anual do CNP. No final de 1967 Ahmed Chukeiry renuncia à presidência da OLP e é eleito Yasser Arafat. Na sessão de 1968 foi aprovada a luta armada como meio de conquistar a libertação da Palestina; Cairo/Egito (1969): Yasser Arafat reeleito por unanimidade presidente do CNP; Cairo/Egito (1970): reafirmação da necessidade da “luta popular armada”; Cairo/Egito (1971): neste ano ocorreram duas sessões, a 8ª. e a 9ª, e surge um intenso debate sobre as táticas da resistência armada; Cairo/Egito (1972): 10ª sessão, extraordinária, onde a luta do povo palestino é apresentada como parte integrante da luta dos povos árabes pela sua independência e libertação; Cairo/Egito (1973): criação do Conselho Central do CNP, que acaba se tornando uma direção política reduzida, composta por representantes das principais organizações da OLP (na origem eram 20 membros, mas depois o número foi ampliado para 70, com o objetivo de ter uma direção política mais representativa das diversas forças); Cairo/Egito (1974): essa sessão foi tomada pela discussão sobre os impactos da Guerra Árabe-Israelense de outubro de 1973; Cairo/Egito (1977): aprovação de aproximação com movimentos e organizações progressistas, democráticas e antisionistas israelenses; Damasco/Síria (1979): crítica dos acordos de Camp David, firmados entre Egito e Israel, sob a mediação do governo dos EUA. O presidente Egípcio Anwar Sadat reconhece o Estado de Israel, estabelece relações comerciais e diplomáticas e inicia um processo de cooperação que vai gerar uma profunda crítica da OLP a este acordo; Damasco/Síria (1981): o CNP aprova a iniciativa da União das Repúblicas Socialistas Soviética (URSS) de organizar uma Conferência Internacional Sobre a Questão Palestina e os Conflitos no Oriente Médio, com participação de todas as partes, inclusive a OLP. Já estava em gestação nessa época a proposta de reconhecimento mútuo entre Estado de Israel e OLP (defendida pela URSS), visando estabelecer uma negociação com base na criação de dois Estados, como já previa o Plano de Partilha da ONU de 1947; Argel/Argélia (1983): foi reafirmada a importância da luta armada e da unidade nacional palestina, num momento onde a OLP acabava de sofrer uma dura derrota, que foi a retirada de suas tropas do Líbano, após a invasão israelense de 1982 e do massacre nos campos de refugiados de Sabra e Chatila; Amã/Jordânia (1984): apesar da pressão e das ameaças da Síria contra a realização deste CNP, estimulando inclusive o boicote de organizações político-militares da OLP controladas e/ou bem relacionadas com seu governo, ocorre a 17ª. sessão, com críticas à tentativa da Síria de dominar a OLP e colocá-la à serviço de seus interesses particulares. O tema da negociação de paz com a participação da ONU, partes envolvidas e OLP ganha força e entra na pauta e é rejeitada qualquer proposta de paz que tente excluir a OLP das negociações; Argel/Argélia (1987): se consolida a unidade política entre as organizações da OLP em relação aos pontos fundamentais da estratégia política adotada, e o Partido Comunista Palestino (PCP), que mantinha relações muito próximas com a URSS, se integra organicamente à OLP (SUWWAN, 1987, p. 09-12); Argel/Argélia (1988): esta sessão do CNP foi decisiva na história da OLP, pois aprovou a Declaração de Independência da Palestina (15 de novembro de 1988), afirmando que o CNP “proclama o estabelecimento do Estado da Palestina em nossa terra palestina, tendo por capital Jerusalém” e, ao mesmo tempo, reconheceu o Estado de Israel, iniciou o debate sobre o abandono da luta armada e iniciou negociações de paz com base na proposta de dois Estados, ou seja, fazer cumprir a antes criticada Resolução 181 da ONU, de 1947. O texto da Declaração e o reconhecimento do Estado de Israel são duas decisões que expressam bem as contradições e conflitos internos na OLP, pois enquanto o texto fala do “Estado da Palestina em nossa terra palestina”, sem fazer referência direta ou explícita sobre quais seriam as fronteiras desse Estado, induzindo o leitor a crer que seria em toda a Palestina histórica, a posição de reconhecimento do Estado Judeu empurra a OLP para uma situação única em sua história, onde os princípios originais de luta pela retomada de todos os territórios ocupados são deixados de lado e substituídos por um pragmatismo orientado pela nova proposta de constituição do Estado Palestino nas fronteiras antes de 1967, o que causa indignação e descontentamento principalmente para os refugiados que perderam suas terras e casas entre 1948 e 1967.

 

Dentro desta frente estão os partidos da esquerda palestina, como a Frente Democrática para a Libertação da Palestina (FDLP), a Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP) e o Partido do Povo Palestino (PPP), antigo Partido Comunista Palestino (PCP). Mas o partido político que sempre ocupou o espaço de força política hegemônica no interior da OLP foi o Al-Fatah[6] (ou simplesmente Fatah), ou Movimento de Libertação Nacional, agrupamento nacionalista laico sob a liderança de Yasser Arafat. Já o Hamas (Movimento de Resistência Islâmica), que governa e que tem mais força política na atualidade em Gaza, nunca fez parte da OLP. Criado em 1987 com apoio da burguesia árabe-islâmica, de governos do Oriente Médio e de organizações como a Irmandade Muçulmana, o Hamas representa uma das principais forças do nacionalismo islâmico, corrente política em franca ascensão nos diversos países árabes. Além do apoio de setores importantes da burguesia árabe-islâmica e governos como o do Irã, esse partido político possui hoje uma base social muito forte entre trabalhadores empregados, subempregados e desempregados dos territórios palestinos de Gaza e Cisjordânia. Nos anos noventa do século XX surgem outros atores no interior do movimento de libertação nacional palestino, como a Jihad Islâmica, partido político que também está fora da OLP. Além de partidos políticos e organizações político-militares, dentro e fora da OLP os palestinos tem organizações de juventude, camponeses, trabalhadores, operários, mulheres[7], entre outros. Nos últimos vinte e quatro anos o movimento da resistência palestina tem priorizado a luta de massas, a mobilização social enquanto principal forma de luta contra as arbitrariedades e a violência praticada pelo governo do Estado de Israel. Surgiram organizações de luta em defesa dos presos políticos, do direito ao retorno dos refugiados, de luta contra o muro do Apartheid construído por Israel ao longo de 700 quilômetros do território palestino, de organização das campanhas pelo boicote e desinvestimento contra Israel, etc.

 

A Questão Palestina e o fim da URSS e do Bloco Socialista: início de um período de defensiva

 

O fim da URSS e do chamado “Bloco Socialista” tem um profundo impacto nas relações internacionais e no movimento nacional de resistência palestina. A força da esquerda no interior da OLP advinha também das relações e do apoio que esse setor tinha com o “mundo socialista”, e da intervenção conjunta desses países nos diversos organismos da ONU. Além disso, os palestinos tinham, até 1991, dois grandes aliados de sua causa no Conselho de Segurança da ONU: URSS e China. As condições eram muito mais favoráveis para aqueles que defendiam a imediata construção do Estado Palestino. Com o argumento de que precisa adquirir maior credibilidade e dar mais uma demonstração de que está disposta a fazer concessões em seu programa original se isso, de fato, for contribuir para o avanço do processo de paz, a OLP altera seu estatuto em 1988, e reconhece o direito do Estado de Israel existir, ao lado de um Estado Palestino, conforme a Resolução 181, de 1947. Ou seja, a OLP reconhece pela primeira vez a legitimidade do Plano de Partilha da Palestina, antes apresentado pela organização como sendo um instrumento da aliança do sionismo com o imperialismo para ampliar sua influência e exercer a dominação territorial de uma parte estratégica do Oriente Médio. Esta posição da OLP encontrou resistência entre os próprios palestinos, mas as forças que se opuseram a tal mudança de posição se encontravam em situação de minoria, e não conseguiram impedir a vitória dessa proposta, que parte de Yasser Arafat e da direção majoritária de seu partido, o Fatah. Mesmo dentro desse partido surgem posições contrárias as de Arafat, o que prova que precisamos observar, no estudo do caso palestino, as contradições e conflitos não só entre o Estado de Israel e as organizações árabes-palestinas, mas também entre as próprias organizações da resistência palestina.

 

Os “acordos de paz” firmados com Israel em 1994 alimentam ilusões e ignoram a natureza expansionista/imperialista deste Estado, que negocia e, ao mesmo tempo, faz crescer o número de colônias judias nos territórios palestinos ocupados em 1948 e 1967. Além disso, Israel aplica até hoje uma política de assassinatos seletivos de lideranças políticas palestinas, e de perseguição e prisão em massa. Um resultado dessa política de repressão intensa e permanente são os 8 mil presos políticos palestinos, alguns vivendo nos cárceres israelenses há pelo menos 20 anos. Desses 8 mil, mais de 700 estão condenados a prisão perpétua. Entre 1993 e 2005, apesar de inúmeras reuniões, conferências e acordos firmados entre a Autoridade Nacional Palestina (ANP) e o governo do Estado de Israel, e apesar das expectativas de uma paz duradoura apresentadas pelo presidente palestino eleito em 1996 com 87% dos votos, Yasser Arafat, o que se viu foi uma continuada violação dos direitos humanos e dos direitos fundamentais do povo palestino, assim como a negação do direito nacional à independência e à soberania, deixando ainda mais distante o sonho do Estado Palestino Laico e Democrático. Os dois signatários dos acordos de Oslo de 1993 morreram. Yitzhak Rabin, pelo lado israelense, assassinado por fundamentalistas judeus-sionistas em 1995 e Yasser Arafat, pelo lado palestino, morre em 2004 resultante de problemas de saúde (mas surgem denúncias que afirmam ter sido consequência de envenenamento gradativo). Esses acordos livraram os palestinos do controle militar israelense em algumas cidades e vilarejos de Gaza e Cisjordânia, criando para a população uma situação melhor do que a anterior, com melhores condições para se desenvolver o comércio, a indústria, a agricultura, educação, a saúde, a cultura e o esporte, enfim, para que seja possível construir/reconstruir uma vida cotidiana com um mínimo de dignidade, mas essa nova situação não resolve plenamente grande parte dos problemas econômicos, sociais e políticos da ampla maioria do povo palestino. Os resultados pífios dos acordos e o não cumprimento da quase totalidade dos termos dos mesmos por Israel levam a uma nova situação de impasse que coloca em xeque as posições da direção da OLP e da agora chamada Autoridade Palestina (AP). O não cumprimento de diversas cláusulas dos acordos, entre elas a suspensão da construção de novos assentamentos judeus e da demolição de casas palestinas ajudam a diminuir a credibilidade que parcela do povo palestino depositava no Fatah, ainda mais com as constantes denúncias – que muitas vezes são comprovadas – de corrupção de líderes e membros desta organização.

 

É nessa conjuntura complexa que ganha projeção como uma alternativa política o partido Hamas. A crise política, ideológica e organizativa dificulta a ascensão da esquerda palestina (FPLP, FDLP, PPP e outros) como força majoritária no movimento de libertação nacional. As denúncias de corrupção e de enriquecimento de muitos dos dirigentes demonstram um processo de degeneração em setores importantes do Fatah. As eleições de 2006 contribuem para acirrar as disputas internas no movimento da resistência palestina, com Hamas vitorioso em Gaza e Fatah na Cisjordânia. A esquerda palestina tem procurado convocar todas as forças progressistas, populares, democráticas e socialistas a se unir num grande movimento nacional de resistência para desencadear novamente uma ofensiva contra as medidas do governo de Israel que visam a acelerar o processo de expropriação de terras do povo palestino, mas parece que todo esse esforço ainda tem sido insuficiente para alterar a correlação de forças dentro e fora da OLP. Quando do ataque militar israelense a Gaza, entre dezembro de 2008 e janeiro de 2009, essa ideia de unidade nacional das forças da resistência palestina adquiriu grande importância, mas até agora parece que existem muitos fatores que ainda impedem que tal proposta volte a ser transformada em realidade. A impressão é que uma unidade política e programática mínima, em torno de alguns pontos de consenso amplamente discutidos com o povo palestino, seria fundamental para tentar se desencadear uma nova ofensiva política, popular e de massas contra o Estado de Israel. A ação unitária de forças como o Fatah, FPLP, FDLP, PPP, Hamas, Jihad Islâmica e demais organizações e partidos políticos palestinos poderia fazer ressur