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Marx: "Carta a Friedrich Bolte sobre a Primeira Internacional"


A Internacional foi fundada para pôr no lugar das seitas socialistas ou semi-socialistas a organização real da classe operária para a luta. Os Estatutos originais, bem como a “Mensagem Inaugural” mostram isso à primeira vista. Por outro lado, a Internacional não teria podido afirmar-se se a marcha da história não tivesse já destruído o sistema de seitas. O desenvolvimento do sistema de seitas socialista e o desenvolvimento do movimento operário real estão sempre na relação inversa. Enquanto as seitas se justificarem (historicamente), a classe operária está ainda imatura para um movimento histórico autônomo. Logo que ela atingir essa maturidade, todas as seitas serão essencialmente reacionárias. Entretanto, repetiu-se na história da Internacional aquilo que a história mostra em toda a parte. O antiquado procura reproduzir-se e afirmar-se no interior da forma recém-alcançada.

E a história da Internacional foi uma luta contínua do Conselho Geral contra as seitas e as tentativas de amadores que procuravam afirmar-se contra o movimento real da classe operária no interior da própria Internacional. Essa luta foi conduzida nos congressos, mas muito mais ainda nas negociações privadas do Conselho Geral com cada uma das seções.

Como em Paris os proudhonianos (mutualistas[1]) foram co-fundadores da Associação, orientaram naturalmente, durante os primeiros anos, o leme para Paris. Em oposição a eles formaram-se aí mais tarde, naturalmente, grupos coletivistas, positivistas, etc.

Na Alemanha — a camarilha de Lassalle. Eu próprio me correspondi durante dois anos com o famoso Schweitzer e demonstrei-lhe irrefutavelmente que a organização de Lassalle não é nada mais do que uma organização sectária e, como tal, inimiga da organização do movimento operário real procurada pela Internacional. Ele tinha as suas “razões” para não compreender isso.

Em finais de 1868, o russo Bakunin entrou para a Internacional com a finalidade de, dentro dela, formar uma segunda Internacional, com ele como chefe, sob o nome de “Alliance de la Démocratie Socialiste”. Ele — um homem sem qualquer saber teórico — pretendeu representar nesse corpo separado a propaganda científica da Internacional e fazer desta a missão especial dessa “segunda Internacional dentro da Internacional”.

O seu programa era uma mistura, apanhada superficialmente à direita e à esquerda — igualdade das classes (!), abolição do direito de herança como ponto de partida do movimento social (disparate saintsimonista), ateísmo de antemão ditado como dogma aos membros, etc., e, como dogma principal, abstenção (proudhonista) do movimento político.

Esta fábula infantil encontrou eco (e tem ainda um certo apoio) na Itália e na Espanha, onde as condições reais do movimento operário estão ainda pouco desenvolvidas, e entre alguns doutrinários fúteis, ambiciosos e ocos na Suíça Francesa e na Bélgica.

Para o senhor Bakunin, a teoria (um lixo que ele amontoou a partir de Proudhon, Saint-Simon, etc.) foi e é coisa secundária — é apenas um meio para a sua autoafirmação pessoal. Se ele é uma nulidade na teoria, no seu elemento é um intriguista.

O Conselho Geral teve de lutar durante anos contra essa conspiração (apoiada até certo ponto pelos proudhonianos franceses, especialmente no Sul da França). Finalmente, desferiu, por meio das resoluções I, II e III, IX e XVI, e XVII da Conferência o golpe há muito preparado[2].

É evidente que o Conselho Geral não apoia na América aquilo que combate na Europa. As resoluções I, II, III e IX dão agora ao Comitê de Nova Iorque as armas legais para pôr fim a todo o sistema de seitas e grupos de amadores e, se necessário, para expulsá-los...

O Comitê de Nova Iorque fará bem em expressar o seu pleno acordo com as decisões da Conferência em uma comunicação oficial ao Conselho Geral.

Bakunin, que foi ameaçado pessoalmente pela XIV Resolução (publicado no Égalité do julgamento de Netchaev) na qual irá expor à luz suas atividades infames na Rússia, está fazendo todo o esforço possível para iniciar um protesto entre o restante de seus seguidores contra a Conferência.

Por esse motivo, ele possui contato com a seção desmoralizada dos refugiados políticos franceses em Genebra e Londres (uma seção numericamente fraca, de qualquer maneira). O slogan dado é que o Conselho de Genebra é dominado pelo pangermanismo (especialmente pelo bismarckismo). Isso se refere ao fato imperdoável de que eu sou um alemão de nascimento e que, na verdade, exerço uma influência intelectual decisiva sobre o Conselho Alemão (O elemento alemão no Conselho é dois terços mais fraco numericamente do que qualquer inglês ou francês. O crime consiste no fato de que os elementos ingleses e franceses são dominados pelo elemento alemão onde a teoria está preocupada (!) em procurar essa dominação, isto é, a ciência alemã é muito útil e realmente indispensável).

Em Genebra, sob o patrocínio do burguês Madame Andrée Léo (que no Congresso de Lausanne foi desavergonhado o suficiente para denunciar Ferré aos seus executores em Versalhes), eles publicaram um jornal, La Révolution Sociale, que argumenta contra nós em quase literalmente todas as mesmas palavras que o Journal de Genève, o jornal mais reacionário na Europa.

Em Londres, eles tentaram estabelecer uma seção francesa, de cujas atividades você vai encontrar um exemplo no nº 42 de Qui Vive? que eu mesmo coloquei. (Também é o número que contém a carta de nosso secretário francês, Seraillier). Esta seção, constituída de vinte pessoas (entre elas vários espiões), não tem sido reconhecida pelo Conselho Geral, mas uma outra seção muito mais numerosa tem sido.

Atualmente, apesar das intrigas desse bando de canalhas, nós estamos realizando uma grande propaganda na França – e na Rússia, onde eles sabem qual valor colocar em Bakunin e onde meu livro sobre o capital está acabando de ser publicado em russo...

O political movement (movimento político) da classe operária tem naturalmente como finalidade a conquista do political power (poder político) para si, e para isso é naturalmente necessária uma previous organisation of the working class (organização prévia da classe operária) com um certo grau de desenvolvimento e resultante das suas próprias lutas econômicas.

Mas, por outro lado, todo o movimento em que a classe operária enfrenta, como classe, as classes dominantes e tenta obrigá-las por meio de uma pressure from without (pressão de fora) é um political movement. A tentativa de impor aos capitalistas isolados uma redução do tempo de trabalho numa só fábrica ou num dado ramo industrial por meio de strikes (greves), etc., é um movimento puramente econômico; em contrapartida, o movimento para impor uma lei das oito horas, etc., é um movimento político. E deste modo surge em toda a parte, a partir dos movimentos econômicos isolados dos operários, um movimento político, um movimento da classe, para impor os seus interesses de uma forma geral, de uma forma que possua força geral, socialmente coativa. Se estes movimentos supõem uma certa organização previous (prévia), eles são na mesma medida, por seu lado, meio do desenvolvimento dessa organização.

Onde a classe operária ainda não está suficientemente avançada na sua organização para empreender uma campanha decisiva contra a violência coletiva e a violência política das classes dominantes, ela tem, de qualquer modo, de ser ensinada por meio de agitação permanente (e de uma posição hostil) contra a política das classes dominantes. Caso contrário, a classe operária continuará a ser uma bola de jogar nas suas mãos, como a revolução de setembro em França[3] demonstrou e como, até certo ponto, está demonstrando o jogo que o senhor Gladstone e Cia. conseguem fazer com êxito até hoje na Inglaterra.

Londres, 23 de novembro de 1871

Karl Marx

Notas: [1] mutualistas: assim designavam a si próprios, nos anos 60 do século XIX, os proudhonistas, que apresentavam o plano reformista pequeno-burguês de libertação dos trabalhadores por meio da organização de ajuda mútua (criação de cooperativas, de sociedades de socorros mútuos, etc.). [2] Referência às seguintes resoluções da Conferência de Londres de 1871: “Sobre as designações de conselhos nacionais, etc.” (resolução II, pontos 1, 2, 3), “Sobre a ação política da classe operária” (resolução IX), “Sobre a Aliança da Democracia Socialista” (resolução XVI) e “Sobre a cisão na Suíça Francesa” (resolução XVII). [3] A de Setembro de 1870 em Paris, depois de recebida a notícia da derrota do exército francês em Sedan, teve lugar uma ação revolucionária das massas populares que conduziu à queda do regime do Segundo Império e à proclamação da república. Contudo, no governo provisório então formado entraram, além de republicanos moderados, também elementos monárquicos. Este governo, encabeçado pelo governador militar de Paris, Trochu, e por Thiers, o seu verdadeiro inspirador, tomou, refletindo as tendências capitulacionistas dos círculos burgueses e latifundiários da França e o seu medo das massas populares, a via da traição nacional e do entendimento com o inimigo externo.

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