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O que nos revela o discurso liberal acerca dos impostos?


O mito de que o “empresariado” paga muito imposto no Brasil não se sustenta na realidade concreta. É o que demonstra o resultado do mais novo programa de perdão de dívidas com a receita do governo reacionário de Michel Temer, batizado eufemisticamente de “Programa Especial de Regularização Tributária” ou PERT. O programa, aprovado em outubro de 2017, teve seu primeiro relatório oficial divulgado hoje e desmentiu as expectativas iniciais do governo: serão perdoados R$ 62 bilhões ao longo de 15 anos em dívidas fiscais da grande burguesia brasileira, quase o dobro dos R$ 35 bilhões esperados inicialmente.

Recentemente, este mesmo governo aprovou uma lei escandalosa que perdoa dívidas passadas no valor de R$ 54 bilhões e concede isenções futuras no valor de R$ 40 bilhões ao ano para petroleiras estrangeiras até 2040 [1]. Também aprovou o perdão de dívidas fiscais de grandes bancos – Itaú, Santander e Bradesco – no valor de R$ 30 bilhões [2]. Para os latifundiários feudais, o “Programa de Regularização Rural” estima perdoar cerca R$ 7,6 bilhões [3]. E para as burocracias municipais e estaduais, bastiões estatais das oligarquias reacionárias, houve o perdão de R$ 12,6 bilhões com o governo federal.

Antes de mais nada, é pertinente apontar a hipocrisia patente no discurso do governo golpista de Michel Temer, que insiste em repetir em uma estratégia de propaganda baseada na chantagem e na mentira, veiculada pelos principais meios de comunicação da grande mídia, sobre as “dificuldades financeiras” e as “dívidas” do Estado brasileiro para justificar a torrente de ataques que desfere contra as massas trabalhadoras. Como um governo tão endividado, com dificuldades financeiras tão grandes pode estar perdoando tantos bilhões – de gente que já é bilionária, cabe ressaltar – a torto e a direito? Por que não há dinheiro para pagar a aposentadoria dos brasileiros, mas há para perdoar dívidas estratosféricas de uns poucos endinheirados? A mesma lógica se aplica para a lei de teto de gastos, que afirma não haver dinheiro para aumentar o financiamento em educação, saúde, infraestrutura, cultura, ciência, tecnologia e tantas outras áreas de importância fundamental para qualquer sociedade.

A verdade, que está escancarada, para quem quiser: ele toma a opção política de resolver a questão orçamentária aumentando substancialmente os ataques contra as massas trabalhadoras ao mesmo tempo em que perdoa dívidas do capital monopolista estrangeiro, da burguesia burocrático-compradora e dos latifundiários em valores recorde. Este é apenas um aspecto do caráter de classe deste governo – da mesma forma que a tendência ao incremento da militarização em comunidades pobres de nosso país seria outro aspecto –, não cabendo a nós neste pequeno texto abordar e discorrer sobre todos eles.

Prosseguindo em nosso raciocínio, pode-se esperar que alguns liberais interroguem estas argumentações com a seguinte crítica: mas os perdões para os empresários servem para faze-los voltar a investir e desta forma reaquecer a economia. Entretanto, sabemos que durante os governos petistas, atacados tão virulentamente por estes mesmos liberais, houveram a partir de 2008 programas de perdão fiscal semelhantes, que absolutamente não redundaram em uma maior dinâmica de investimentos em nossa economia, muito menos em um incentivo ao desenvolvimento tecnológico; mas sim em uma profunda crise e uma consequente recessão da qual não saímos até hoje. Os lugares que conferiram estas características – dinamismo e desenvolvimento – para a economia brasileira na última década foram justamente aqueles controlados pelo Estado, com destaque para o papel da Petrobras e da indústria naval e para-petrolífera, também impulsionada pelas gestões petistas, ainda que de outras formas [4].

Outro ponto que deve ser colocado para a argumentação liberal acerca do PERT é que as empresas que aderiram ao programa, em sua maioria, optaram pelo pagamento a vista de suas dívidas, ou seja, para conseguirem o máximo de desconto quitaram toda sua dívida com o Estado a vista. De acordo com o relatório da receita, mas também de acordo com a lógica, isto indica que estes empresários não estavam com uma dificuldade de caixa tão aguda ao ponto de terem que financiar estas dívidas em 15 anos. Eles simplesmente financiaram em um período tão longo porque estavam esperando condições mais vantajosas para quita-las. Evidentemente, conseguiram barganhar melhor com um governo golpista, indício da pouca moralidade de nosso “alto empresariado”.

Por fim, se a questão fosse mesmo “reaquecer a economia” e não beneficiar uma casta seleta, deve-se explicar porque este mesmo governo vetou em janeiro deste ano o “Simples Nacional”, um programa de refinanciamento de dívidas fiscais que beneficiaria mais de 600 mil micro e pequenos empresários brasileiros, justamente os responsáveis pela maior parte da geração de empregos em nosso país. O governo Temer e os liberais que o defendem, aberta ou dissimuladamente, dificilmente poderão esconder o caráter antinacional destas medidas.

Isso nos leva para outro ponto fundamental e também nossa pequena conclusão: a hipocrisia dos próprios think tanks liberais que ocupam tantas páginas de jornais e tempo de televisão para justificar todo este saqueio institucionalizado que acontece contra os trabalhadores brasileiros ao mesmo tempo em que gostam de latir sobre os “altos impostos” pagos pelo empresariado em nosso país. Pois fica evidente que o “empresariado” não paga imposto demais por aqui, simplesmente porque eles não pagam nada.

Se é verdade que o Estado moderno é um instrumento de dominação da burguesia, o sistema tributário que ele estabelece serve para garantir alguma estabilidade social para assegurar esta dominação. Mas em uma perspectiva histórica, este mesmo sistema tributário também representa um aspecto progressista que a burguesia já possuiu, por ser capaz de conferir avanços sociais e democráticos importantes para todo o conjunto de uma nação. O desprezo que a grande burguesia brasileira e sua intelectualidade liberal adquiriu nos dias de hoje em relação aos impostos é também sintoma de sua conversão em uma classe social eminentemente parasitária, cuja capacidade civilizacional está esgotada.

Publicado originalmente em 3 de março de 2018

Escrito por G. Nogueira

Notas e referências

[1]: Ver mais informações em: https://www.novacultura.info/single-post/2017/12/05/Temer-a-servico-da-Shell

[2]: Ver mais informações em: http://spbancarios.com.br/08/2017/em-tres-meses-temer-perdoa-quase-r-30-bi-dos-bancos

[3]: Sobre o “Programa de Regularização Rural”, o perdão para Estados e municípios, bem como outras informações expostas no texto, ver mais em: http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,refis-de-temer-vai-perdoar-r-62-bilhoes-o-dobro-do-previsto,70002208770

[4]: A despeito do senso comum que afirma a “falência” da Petrobras, a tese de doutorado do economista Marcelo Sartorio Loural prova a importância da nossa principal estatal para impulsionar e dinamizar uma série de cadeias produtivas subjacentes à do petróleo e, consequentemente, toda a economia nacional. O texto está disponível em: http://repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/305659. Sobre a farsa do endividamento da Petrobras é válido consultar os dados trazidos pela AEPET em: http://www.aepet.org.br/noticias/pagina/14468/O-Mito-da-Petrobras-quebrada

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