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"Dois séculos depois, Carta da Jamaica permanece viva!"


Mesmo nos anais curtos do continente mais jovem, como é o Novo Mundo, será esta a primeira ou a última vez que nas linhas de uma epístola se fale das circunstâncias passadas, presentes e do futuro provável de nossa América; mas a Carta da Jamaica, legado incomensurável do pensamento e da ação de Simón Bolívar, é exaltada demasiadamente por possuir tanta base, tanta visão e transcendência.


Este 6 de setembro farão 200 anos do formidável texto do ‘’ El Libertador’’, que ainda sob a angústia do exílio na colônia insular inglesa e alegadamente movido pelo seu otimismo resultado da derrota que é considerada o fim da primeira fase da Independência da América Meridional, retrai o ânimo contra essas influências e guarda uma acuidade de análise e clareza sobre o que aconteceu e o que estava prestes a acontecer.


Por meio de uma prosa cultivada no estilo e baseada em uma ampla bagagem política, histórica e cultural da civilização universal de até então, Bolívar descreve com detalhada objetividade as condições que nas distintas porções do continente emancipado do jugo espanhol, dariam origem a esta fragmentação que minou o sonho de construção coletiva da soberania, e impuseram pela força os interesses diversos das oligarquias regionais, estas que lutaram contra, desde as tropas patrióticas até grupos constituídos pelas camadas mais exploradas e humildes.


Em primeiro lugar, a Carta coloca uma posição de separação irrevogável das terras americanas com a Espanha, não por vontade política do pensador, mas sim pelas condições intransponíveis que mediavam na relação da Metrópole com as colônias após a primeira parte do processo de libertação e a intenção daquela de reimpor seu domínio.


Mas a realidade daquele momento era muito complexa, e para meados de 1815, as circunstâncias romperam com a continuidade da revolução independentista. Na Nova Granada os monarquistas se apoderam do controle, e a Segunda República venezuelana recebe uma sublevação de escravos e criadores de gado contra Bolívar, que é levado ao exílio, em um capítulo semelhante ao levado a cabo contra Francisco de Miranda no final da Primeira República.


A esta altura, instalado na Jamaica, já tem claro que a derrota da revolução independentista frente ao exército monarquista foi basicamente uma consequência do conflito de interesses entre o quadro de classes sociais que compunham a sociedade colonial do continente. Ou seja, que a primeira fase da façanha libertadora não havia sido senão uma revolução política contra o absolutismo monárquico, da qual as camadas superiores lutaram por seus diretos políticos em uma espécie de monarquia constitucional, as classes médias pelos seus em uma república independente, e as camadas exploradas apenas para melhor sua qualidade de vida e ser tidas em conta.


Em breve se veriam como os efeitos da restauração de Fernando VII, a anulação da Constituição de Cádiz e a contraofensiva sanguinária do general Pablo Morillo na Venezuela e em Nova Granada, passariam sem distinguir privilégios sobre os interesses de todas as classes, e então eles convocariam a unidade que consolida a independência da Espanha em sua segunda fase, entre 1818 e 1825.


No debate a respeito da conveniência dos regimes que imperariam nas nações da América, Bolívar estabelece a possibilidade, em umas a monarquia, e em outras a república; mas insistiu que pela natureza e princípios haviam de ser, em qualquer caso ‘’ liberais e justos’’, baseados no equilíbrio dos poderes públicos.


Haveria participação, porém, sob uma direção ilustrada que garantiria a construção do governo sob a base dos pensamentos mais avançados da época, e é neste parágrafo onde se apela às formas e assistências típicas do modelo governamental britânico. Devoto como era dos postulados de Montesquieu, parafraseia sua famosa sentença: "É mais fácil tirar um povo da servidão do que subjugar um povo livre."


Contudo, a questão mais palpitante levantada por Bolívar, e que coloca a Carta da Jamaica como um documento avançado, visionário, e, caso queiramos, como um documento de caráter proclamatório, é o reconhecimento da unidade continental como fator essencial para a emancipação completa, e para a articulação de uma defesa organizada posterior.


A partir da próxima campanha militar, passar ia-se a se constatar a veracidade das reflexões dos bolivarianos quanto à unidade continental, mesmo que não se devesse cair no equívoco de que a proposta da Carta fosse um chamado à constituição da América Meridional como um único estado nacional. Bolívar coloca tal objetivo como algo candente. Porém, tal objetivo é descrito por Bolívar tão apenas como um desejo, como algo ideal, por nas condições de então e até mesmo num futuro imediato, tal objetivo seria impossível de realizar. Levando em conta o contexto político da época, e atendo-se bem ao conteúdo da Carta, Bolívar expressa uma proposta de aliança, de confederação de várias repúblicas (15 ou 17 estados independentes entre si) que formariam uma espécie de bloco constituindo uma força política, econômica e militar na região, como a que foi convocada uma década depois do Congresso do Panamá, e acabou sabotado.


Há outras evidências quanto à clarividência com que Bolívar enxergou muito mais além da realidade de então; entre elas, o papel que poderia jogar na dinâmica mundial do comércio o istmo panamenho, a participação das classes exploradas na política, a necessidade de uma política anti-escravocrata, assim como o caráter e as formas que a revolução tomaria em cada parte do continente.


Não obstante, ninguém, a esta altura da história, duvidaria que a concepção da unidade seja a visão mais destacada expressa na Carta da Jamaica. Não importa que tenha sido sabotada no decorrer de sua aplicação. Definitivamente, daqueles dias para cá, sempre houveram esforços periódicos pela integração regional. Hoje mesmo, em nosso continente, não há nada mais ameaçado pelos Estados Unidos (país este que Bolívar compreenderia prontamente como de caráter hegemônico e imperial, e alertaria quanto a seus fins ameaçadores) e pelas oligarquias regionais do que a magnífica unidade das nações da América do Sul. Seguem intactos - brigando contra as marés desestabilizadoras e segregacionistas - os mecanismos de integração fortes e efetivos como a CELAS, ALBA, UNASUL e MERCOSUL. O anúncio da lendária Carta da Jamaica, 200 anos depois, não é letra morta.


por Dilbert Reyes Rodríguez,

publicado pelo ‘’ Granma’’, órgão oficial do Partido Comunista de Cuba.

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