Martens: "Mao Tse-tung e Enver Hoxha e a luta sobre duas frentes"

Quando elaboramos nossas posições políticas é essencial combater não somente os desvios oportunistas de direita, senão também as tendências esquerdistas. Também há que esforçar-se em localizar os aspectos contraditórios das questões que se debatem.
Desde 1978, quando o Partido do Trabalho da Albânia formulou críticas exageradas e acusações gratuitas contra o Partido Comunista chinês, deixamos de estudar suas análises. Ainda que muitos dos nossos desacordos com o PTA tivessem fundamento, esta atitude não podia justificar-se. Inclusive se alguns partidos marxista-leninistas cometem graves erros, se desviam pela via do revisionismo ou do esquerdismo, devemos estudar sua evolução, tirar lições de seus erros enquanto seguimos tirando lições de suas experiências válidas. Nas críticas ao oportunismo e do revisionismo que formulou o camarada Enver Hoxha, podemos encontrar muitos elementos válidos. Poderíamos aproveita-las sem por isso estar de acordo com a orientação global de sua linha. Ao mesmo tempo, a observação crítica dos erros de Enver Hoxha poderia haver-nos posto em guarda contra os erros similares em nosso próprio partido.
A seguir analisamos alguns aspectos dos dois tomos que Enver Hoxha publicou sob o título de Reflexões sobre a China, publicados em Tirana em 1979.
Firmeza nos princípios, flexibilidade na tática
Enver Hoxha deu mostras de uma grande vigilância frente ao oportunismo. Sempre teve em conta as possíveis consequências de certos giros direitistas.
Ao começo dos anos 60, quando os revisionistas Khrushchevistas deram alguns passos “a esquerda”, Enver Hoxha desmonta rapidamente seu duplo jogo e revela suas intenções reais.
Em 1962, quando Khrushchev pede o fim da luta ideológica, Enver Hoxha sublinha que ele busca a tranquilidade para poder avançar mais longe pelo caminho da traição.
Em 1965, após a queda de Khrushchev, Brejnev propõe a todos os revolucionários a formação de uma “frente comum anti-imperialista”. Enver Hoxha vê imediatamente quais são os objetivos desta nova tática. Primeiro, atacar verbalmente e demagogicamente os imperialistas para persuadir os revolucionários. Depois, controlar aos comunistas chineses e apelidando-os de “sectários” e “antiunitários” em caso de que ousassem seguir lutando contra o revisionismo soviético. Finalmente, prosseguir com a colaboração com o imperialismo americano, porém com uma maior discrição do que teve Khrushchev, enquanto faz algumas pequenas chantagens aos Estados Unidos. E Enver Hoxha conclui que uma unidade revolucionária, combativa, contra o imperialismo não é possível enquanto os soviéticos não renunciem a suas concepções oportunistas fundamentais.
Porém também podemos notar, desde o princípio, alguns aspectos esquerdistas nas análises do PTA.
Em 1962, o Partido Comunista chinês propõe aceitar uma reunião com o PCUS para eliminar as divergências e reforçar a unidade do campo socialista. O PCCh diz que faz falta manter uma certa aparência de unidade e levantar a bandeira do marxismo-leninismo, a luta anti-imperialista e a unidade; isto proporcionaria melhores condições para que se desenvolvam núcleos revolucionários em diferentes partidos comunistas dirigidos por revisionistas.
Enver Hoxha conclui em seguida: “Este é um caminho vacilante, oportunista e com consequências”. Entretanto, esta flexibilidade do PCCh estava justificada e havia de ter em conta a possibilidade de viragens políticas no seio do PCUS. Havia que manter contatos tão amplos quanto fosse possível com o PCUS para influenciar aos membros e aos quadros em um sentido marxista-leninista. Enver Hoxha vê aí “uma acentuada tendência face a moderação e a passividade”. Lênin sempre defendeu a firmeza nos princípios e a flexibilidade na tática. Hoxha defende a firmeza nos princípios rechaçando a flexibilidade, que segundo ele sempre suporá vacilação e concessões.
Hoxha defende sua tática esquerdista a partir de uma análise otimista e subjetivista da situação no movimento comunista: “Os camaradas chineses parecem ter a moral afundada, suspeitam da luta contra os revisionistas, superestimam as forças do inimigo e subestimam as nossas”.
Clarividência política e combate vantajoso
Em 1964, Enver Hoxha desvelou com grande perspicácia a tendência à aproximação entre os revisionistas iugoslavos, romenos e italianos, tendência que vem a luz no seio do Partido Comunista chinês. Sublinha com muita pertinência: “Os grupos revisionistas, titistas e Khrushchevistas estão a cabeça do revisionismo moderno e se observa claramente neles a tendência ao reagrupamento de dois polos em seu seio: o polo soviético e o polo iugoslavo-policentrista italiano. Os titistas trabalham para consolidar os agrupamentos que dirigem e o fazem como sempre, para fazer degenerar o marxismo-leninismo”.
Em 1968, Enver Hoxha destaca quatro debilidades e erros na luta levada pelo Partido Comunista chinês contra o revisionismo.
“Os camaradas chineses não têm uma clara visão ideológica das coisas. Não concebem claramente o que é o revisionismo moderno, o revisionismo titista e khrushchevista, nem em que consiste sua grande novidade. (…)
Em segundo lugar, acerca de Tito e do titismo, seguem pensando que 'não é Tito quem se equivocou, senão que foi Stalin quem se equivocou ao respeito dele'. E quando a conjuntura leva a Tito a ter divergências com os soviéticos, os camaradas chineses o veem com melhores olhos. (…)
Em terceiro lugar, os camaradas chineses manifestam em sua luta algumas tendências ao chauvinismo contra a União Soviética, emitem algumas pretensões territoriais e juízos pouco fundados sobre os supostos erros de Stalin no movimento comunista internacional.
Em quarto lugar, para os camaradas chineses, qualquer um que se apresente como adversário dos soviéticos é um possível aliado, sem considerar a identidade deste pseudo-aliado”.
Porém o mesmo Enver Hoxha também declara:
“O revisionismo moderno deve ser combatido pelos marxista-leninistas com perseverança, sem vacilar, até o final, sob a forma que seja, em qualquer tempo e circunstância”. “Não faremos nenhuma concessão a Khrushchev, não chegaríamos a nenhum compromisso com ele, porque é um traidor”. É necessária “a ruptura definitiva com os revisionistas”. “Educar as massas para a revolução nos países revisionistas da Europa é uma tarefa indispensável. (…) (Os marxista-leninistas devem) aceitar a luta ferrenha contra as camarilhas revisionistas-fascistas e consentir grandes sacrificios”.
Se podemos estar de acordo com Enver Hoxha na necessidade de mostramo-nos firmes na luta de princípios contra o revisionismo, a flexibilidade na tática durante esta luta também tem uma grande importância. Faz falta uma análise concreta das diversas correntes políticas nos países socialistas, há que saber onde podem produzir-se agrupamentos de forças marxista-leni