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"O desenvolvimento acelerado dos mísseis da Coreia do Norte"
Desde que o presidente Trump tomou posse, a Coreia do Norte tem efetuado uma série de testes de mísseis, o que disparou uma onda de condenações por parte dos media dos EUA e figuras políticas. Esta reação contém mais de um componente de instilação do medo e por vezes é insinuado que uma vez tendo a Coreia do Norte um míssil balístico intercontinental (ICBM), ela tenderá a lançar um ataque não provocado sobre o território continental dos EUA.
O que costuma faltar em tais relatos é qualquer sentido de reflexão sóbria e, assim, é semeada muita confusão quanto ao estado atual do programa da Coreia do Norte. Este artigo examina mais atentamente os recentes lançamentos de mísseis da Coreia do Norte e argumenta que eles colocam uma ameaça não à segurança da população dos EUA, como afirmam os media corporativos, mas sim aos cálculos estratégicos dos Estados Unidos na região.
Pukguksong-2 Testado primeiramente em 11 de Fevereiro, o Pukguksong-2 é um míssil balístico de médio alcance baseado no desenho do Pukguksong-1 lançado de submarino. A principal vantagem do Pukguksong-2 tem sobre outros mísseis balísticos baseados em terra da Coreia do Norte é que ele confia em combustível sólido. Por esta razão, o Pukguksong-2 é muito mais móvel e tem mais capacidade de sobrevivência do que outros mísseis de médio alcance apresentados pela Coreia do Norte. Os demais mísseis usam combustível líquido e portanto são embaraçados pela necessidade de serem acompanhados por camiões cisterna quando se movem [sobre o terreno]. A sua necessidade de um prolongado processo de enchimento de combustível antes do lançamento torna-os vulneráveis a ataques .
Voando numa trajetória quase vertical, o Pukguksong-2 viajou 500 quilômetros e atingiu um apogeu de 550 km. Isto traduz-se num alcance de 1200 km, se o míssil fosse disparado numa trajetória regular usando a mesma carga útil .
Uma das razões para a trajectória inabitualmente aguda do teste foi o facto de que os técnicos estariam dentro da amplitude técnica de monitoração para reunir dados sobre o desempenho . O caminho inabitual do voo também pode ter sido adoptado, como indica a Coreia do Norte, para evitar sensibilidades políticas quanto ao sobrevoo do Japão.
O míssil foi testado outra vez em 21 de Maio e seguiu uma trajetória semelhante à primeira. Apesar da afirmação da Coreia do Norte de que o míssil deveria entrar em produção em massa, são necessários mais testes para confirmar a fiabilidade e precisão. Não parece que o veículo de reentrada tenha sido testado nesta ocasião, pois faltavam as aletas ou propulsores necessários para a capacidade de orientação terminal. Segundo o perito em mísseis John Schilling , "provavelmente levará pelo menos cinco anos" para o Pukgukdson-2 se torne "a base da força de mísseis estratégicos da Coreia do Norte e, mesmo então, só numa versão de primeira geração com uma ogiva não manobrável".
O desempenho divergente dos dois testes indica que há desafios não vencidos no processo de manufactura do motor para que possa produzir resultados consistentes.
Hwasong-12 Após três lançamentos falhados em Abril deste ano, o Hwasong-12 de alcance intermédio teve êxito em 14 de Maio. Ao contrário do Pukguksong-2, estes míssil é a combustível líquido. Segundo a opinião geral, o desempenho do Hwasong-12 demonstrou um avanço tecnológico significativo em relação a qualquer dos outros mísseis da Coreia do Norte. No último teste, o míssil voou num ângulo íngreme de 85 graus e alcançou a altura de 2.111 quilômetros. Calcula-se que numa trajetória normal isto equivaleria a um alcance de 4.500 km, tornando-o capaz de atingir a força de bombardeiros estratégicos dos EUA em Guam.
Ainda mais importante, isto assinalou o primeiro teste com êxito da Coreia do Norte de um veículo de reentrada . Uma ogiva nuclear deve ser capaz de suportar o enorme calor gerado pela reentrada na atmosfera da terra a fim de atingir seu alvo. Sem esta capacidade, a Coreia do Norte não teria um dissuasor nuclear efetivo. O equipamento de monitoração da Coreia do Sul captou dados de comunicações entre a descida da ogiva e centro de controle da Coreia do Norte, confirmando o êxito do teste.
Mísseis anti-navio
Em 29 de Maio a Coreia do Norte testou uma versão melhorada do Hwasong-7 . Dentre as melhorias estavam as aletas para melhorar a estabilidade durante a fase do arranque, um motor na secção do meio para controle de velocidade e tecnologia de orientação terminal para proporcionar mais precisão. Diz-se que o míssil tem um alcance de 1.000 quilômetros e destina-se a atingir alvos no mar.
Pouco mais de uma semana depois, a Coreia do Norte lançou vários mísseis de cruzeiro anti-navio, os quais demonstraram excelente manobrabilidade e precisão. Segundo os media norte coreanos , os mísseis "detectaram com precisão e atingiram os alvos flutuantes no mar a Leste da Coreia depois de efetuar voos circulares". A distância do voo foi estimada em 200 km e, tal como outros mísseis da Coreia do Norte testado este ano, os mísseis de cruzeiros são redesenhados.
Os mísseis de cruzeiro foram disparados de veículos de transporte com lagartas que são capazes de viajar através de terrenos acidentados, permitindo-lhes portanto irem para onde seria mais difícil localizá-los e destruí-los. O futuro ICBM da Coreia do Norte
Os media ocidentais, que se estendem na especulação mas escasseiam na informação, tentam fazer-nos acreditar que a Coreia do Norte está à beira de testar um ICBM a qualquer momento. Mas há desafios tecnológicos envolvidos no desenvolvimento de um ICBM que serão muito mais difíceis de ultrapassar do que com o Hwasong-12.
O alcance mais distante de um míssil balístico, o nível de calor total mais elevado que um veículo de reentrada deve ser capaz de suportar. A taxa de calor associada ao alcance – e portanto à velocidade – aumenta tão rapidamente que um teste com êxito de um veículo de reentrada de um míssil balístico intermediário nada diz acerca de como ele se comportaria num ICBM. Um veículo de reentrada lançado por um ICBM deve aguentar condições muito mais árduas do que mísseis de alcance mais curto. Os Estados Unidos tiveram de gastar vários anos para dominar o desafio de conceber um veículo de reentrada de ICBM que pudesse sobreviver.
Uma ogiva nuclear deve ser miniaturizada para reduzir o peso a fim de que possa ser entregue por um míssil. Como especialistas em tecnologia militar, Markus Schiller e Theodoro Postol destacam : "É improvável que a Coreia do Norte tenha agora uma arma nuclear que pese apenas 1000 kg. Também é improvável que uma tal arma de primeira geração fosse capaz de sobreviver à inevitável desaceleração dos 50 G durante a reentrada da ogiva depois de uma viagem de cerca de 10 mil quilómetros".
Pensa-se que o Hwasong-12 poderia servir de base para o desenvolvimento de um ICBM. Entretanto, o míssil precisaria serredesenhado para acrescentar mais um estágio para fazer isso. Recentemente a Coreia do Norte testou sobre o terreno um motor de foguete, o qual responsáveis dos EUA especulam que poderia ser destinado a mover o último estágio de um ICBM. Com base apenas em imagens de satélite , esta conclusão não passa de suposição. Pouco importa a natureza do teste do motor, uma quantidade significativa de trabalho permanece por fazer para readaptar um míssil existente para ICBM e aperfeiçoar a tecnologia associada, tal como o sistema de orientação e o veículo de reentrada.
Além disso, antes de um míssil poder ser considerado pronto operacionalmente ele deve passar por múltiplos testes para assegurar que cumpre padrões de desempenho e fiabilidade. O Hwasong-12 teve êxito apenas em um dos seus quatro testes.
Ameaças e provocações
É um artigo de fé no ocidente que cada teste de míssil da Coreia do Norte é uma "ameaça" ou "provocação". Mas será verdade? Ao longo dos últimos meses, a Índia testou os seus mísseis balísticos Agni-2 de médio alcance e Agni-2 de alcance intermediário, assim como um ICBM Agni-5, produzindo apenas bocejos de indiferença. O Paquistão disparou um míssil balístico Ababeel de médio alcance, capaz de entregar múltiplas ogivas nucleares, enquanto tanto a China como a Rússia testaram ICBMs. Os Estados Unidos, enquanto condenavam violentamente a Coreia do Norte pelos seus testes, lançavam mísseis Minuteman 3 de Trident. Nenhum destes testes por potências nucleares foi considerado provocador. Nem sequer foi considerada a hipocrisia da administração Trump ao manifestar ultraje por a Coreia do Norte fazer o que ela estava a fazer.
Falando com objectividade, não há diferença entre os testes de mísseis da Coreia do Norte e os outros, embora deva ser destacado que o arsenal dos EUA de aproximadamente 7000 ogivas nucleares torna insignificante o da Coreia do Norte.
Como observou o ministro norte-coreano dos Negócios Estrangeiros, "Nem um único artigo ou disposição na Carta das Nações Unidas e outras leis internacionais estipula que testes nucleares ou lançamento de foguetes balísticos apresenta uma ameaça à paz e segurança internacional". O poder político e econômico dos Estados Unidos dá-lhe os meios para incitar outros membros do Conselho de Segurança a concordarem com a sua exigência de impor sanções à Coreia do Norte. Em consequência, a Coreia do Norte é o único país escolhido pelas sanções da ONU que proíbem testar os mesmos tipos de mísseis que outros países ficam livres para fazer. Não há base legal para este duplo padrão, o qual é primariamente um produto da influência dos EUA.
Da perspectiva norte-coreana, exercícios militares de grande escala que os Estados Unidos conduzem regularmente em tandem com a Coreia do Sul são ameaçadores. Estes ensaios treinam a invasão da Coreia do Norte, incluindo operações de decapitação para matar líderes norte-coreanos. Recentemente, aviões bombardeiros americanos B-1B executaram uma série de voos sobre a Coreia do Sul, praticamente o tapete de bombardeamento (carpet bombing) da Coreia do Norte. Concebido originalmente para entregar armas nucleares, o B-1B passou por uma conversão para armas convencionais há apenas dez anos atrás. Este avião ainda é uma arma formidável e pode transportar três vezes a carga útil de um B-52.