top of page
textura-03.png

Nkrumah: "O espectro do Black Power"

Foto do escritor: NOVACULTURA.infoNOVACULTURA.info

Para

Ernesto Che Guevara

Ben Barka

Malcolm X

We could mourn them

but they don't want our tears.

We scorn death knowing

that we cannot be defeated.

Introdução

O Pan-africanismo tem sua origem na luta de libertação dos a­fro-americanos, expressando as aspirações de africanos e dos povos de descendência africana. Da primeira Conferência Pan-africana, realizada em Londres em 1900, até a quinta e última Conferência Pan-africana realizada em Manchester em 1945, os afro-americanos se mostraram a principal força dirigente do movimento. O Pan-Africanismo então guinou para a África, sua verdadeira casa, com a realização da Primeira Conferência dos Estados Africanos Independentes em Accra, em abril de 1958, e a Conferência do Povo de toda a África, em dezembro daquele mesmo ano.

O trabalho dos antigos pioneiros do Pan-africanismo tais como Sylvester Williams, Dr W.E.B. Du Bois, Marcus Garvey, e H. George Padmore, nenhum deles nascidos na África, se tornou uma parte separada da história africana. É significativo que dois deles, Dr. Du Bois e George Padmore, vieram morar em Gana sob meu convite. Dr. Du Bois morreu, como desejava, em solo africano, enquanto trabalhava em Accra na Enciclopédia Africana. Padmore tornou-se meu assessor em assuntos africanos, e gastou os últimos anos de sua vida em Gana, ajudando na luta revolucionária pela unidade africana e pelo socialismo.

As estreitas ligações estabelecidas entre os africanos e os povos descendentes da África por cerca de meio século de luta comum continua a nos inspirar e nos fortalecer. Pois, ainda que as formas externas de nossa luta possam mudar, na essência permanecem a mesma, uma luta até a morte contra a opressão, racismo e exploração.

A maior parte da África agora conquistou a independência política. Mas o imperialismo não desapareceu. O capital financeiro internacional, aparecendo agora na sua nova forma de neocolonialismo, busca manter e estender seus domínios sobre a vida econômica de nosso continente. Os imperialistas e neocolonialistas estão recorrendo a todo tipo de estratagema para garantir seus objetivos. Se aliaram com os elementos reacionários em nosso meio para organizar golpes militares e outras formas de ação direta em uma tentativa de travar o avanço da Revolução Africana. Ao mesmo tempo, estão trabalhando das formas mais traiçoeiras para minar nossa moral e desviar nossa atenção do principal propósito de nossa luta – a total libertação do continente africano, um governo de união de toda a África e o socialismo.

A Organização da Unidade Africana tornou-se praticamente i­nú­til co­mo resultado das maquinações dos neocolonialistas e seus fantoches. Assim, está sendo mantida como uma organização inócua na esperança de que se possa atrasar a formação de uma organização pan-africana verdadeiramente eficaz que levará à unificação política genuína. O incentivo está sendo dado à formação das organizações econômicas regionais africanas no conhecimento de que sem coesão política serão ineficazes e irão servir para fortalecer, e não enfraquecer, a exploração e dominação neocolonialista.

Toda forma de excentricidade está sendo usada para distrair e desviar de nosso propósito. Existe a conversa do “socialismo africano”, socialismo ára­be, socialismo democrático, socialismo muçulmano, e em último lugar, o “padrão pragmático de desenvolvimento”, e assim todos alegando que encontraram as soluções para nossos problemas.


Assim como existe apenas um socialismo verdadeiro, o socialismo científico, cujos princípios são universais e permanentes, existe a­penas um caminho para conquistar os objetivos revolucionários da Á­frica, de libertação, unificação política e socialismo. Se chega a este caminho pela luta armada. A época de discursos, conferências, soluções temporárias, por acordos está no passado.

De forma semelhante, com o surgimento do Black Power nos Estados Unidos da América, o movimento de libertação dos afro-americanos se tornou militante, e armado. Mas, como na África, o movimento tem que estar atento, contra o inimigo interno, bem como o inimigo externo. Deve haver um cerramento de fileiras e um persistente esforço conjunto para levar a cabo a luta até uma conclusão vitoriosa.

O espectro do Black Power

Com uma força e poder de decisão que não podem mais se manter ocultos, o espectro do Black Power desceu sobre o mundo como um raio ca­indo do céu. Surgindo dos guetos, pântanos e campos de algodão dos Estados Unidos, agora assombra as ruas, assembleias legislativas e gabinetes su­periores e assim chocou e aterrorizou estadunidenses, fazendo com que apenas agora estejam começando a compreender seu significado pleno, o fato de que o Black Power, em outras manifestações, está em confronto com o imperialismo, colonialismo, neocolonialismo, exploração e agressão em várias partes do mundo.

Nos EUA, a “Questão Negra” tem sido uma discussão mais ou menos delicada desde que os primeiros escravos de África pousaram em James Town em 1619. Por três séculos e cinquenta anos, entretanto, o assunto das “revoltas de escravos” se tornou um tabu e foi eliminado dos livros didáticos. Nos últimos 30 anos, foram feitos esforços rigorosos para encobrir e obscurecer o problema real da Guerra Civil dos Estados Unidos: se a escravidão dos africanos deveria continuar ou não. De fato, não é mais considerado apropriado nos Estados Unidos mencionar a “Guerra Civil”. Algumas vezes se fazem referências delicadas à “guerra infeliz entre os Estados”.

Após a Guerra Civil, as 13ª, 14ª e 15ª Emendas da Constituição dos Estados Unidos aboliram a escravidão africana e garantiram direitos de cidadania aos homens livres. Imediatamente, a maioria dos Estados passaram leis anulando estes direitos e, em geral, a opinião pública de todo o país apoiaram suas ações. Alguns legisladores apontaram a injustiça e mesmo os perigos de seguir este rumo, e em 1875 o Congresso passou uma Lei de Direitos Civis moderada para os homens libertos. Contudo, em 1884, a Lei foi revogada pela Suprema Corte dos Estados Unidos. E assim, ao longo dos anos, o povo de descendência africana vem pedindo, implorando, indo aos tribunais e protestando por “direitos” livremente garantidos a qualquer imigrante naturalizado.

À medida que os Estados Unidos ficavam mais ricos, mais poderoso e imperialista, enquanto se expandia e estendia sua influência e controle pela América Latina e as ilhas do Caribe, seu racismo, opressão e desprezo pelos povos africanos se tornou aceito como parte da cultura norte-americana.

A Revolução de Outubro da Rússia não penetrou nas massas dos afro-americanos. Alguns intelectuais, no entanto, a saudaram como um triunfo dos oprimidos e dos explorados, uma vitória proletária socialista. Alguns viajaram para a recém estabelecida União Soviética. Vários continuaram ali, e deram sua força e habilidade para construir o primeiro Estado socialista do mundo. Mas aqueles que retornaram não encontraram meios de aplicar o que haviam visto para a situação dos Estados Unidos. Enquanto isso, operários brancos estavam organizando agitações por melhores condições de trabalho. Mas até a organização do Comitê por Organização Industrial (CIO) e a Segunda Guerra Mundial, os negros americanos eram regularmente excluídos das organizações trabalhistas. A necessidade de aumentar a mão de obra durante este período encorajou a imigração do Sul de milhares de trabalhadores negros que se aglomeravam para cidades do Norte à procura de emprego, porém sem lugar para viver, a não ser em favelas em meio a condições muito piores do que os barracos rurais que haviam deixado no Sul.

Apesar do longo e incansável trabalho na educação e organização dos pioneiros dos “Direitos Civis”; apesar dos esforços diligentes dados por cidadãos afro-americanos dos Estados Unidos para educar seus filhos e do trabalho duro para alcançar a “aceitação” na sociedade americana, os negros americanos mantiveram-se apenas como estrangeiros excluídos em sua terra natal, a grande massa deles relegados da básica justiça humana.