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Camponeses são ameaçados de despejo no interior de São Paulo


Cerca de 20 famílias camponesas assentadas na cidade de Gália, no interior de São Paulo, estão sob ameaça de despejo após decisão da Justiça Federal de Bauru. Publicada no Diário da Justiça no dia 24 de abril, a decisão determina um prazo de 120 dias para a desocupação de parte do assentamento Luiz Beltrame, sem, entretanto, oferecer nenhuma solução para a situação dos camponeses. Em meio a uma gravíssima epidemia que exige que cada pessoa permaneça o máximo possível em sua própria casa, a Justiça brasileira quer retirar de uma só vez a moradia e o sustento dessas famílias.

Formado por um total de 77 famílias, o assentamento Luiz Beltrame nasceu da luta dos camponeses da região pelo direito à terra. Os camponeses, organizados pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), iniciaram as ocupações de latifúndios improdutivos na região ainda em 2009, fazendo a luta avançar, mesmo debaixo de lona, por anos. Em 2012, teve início o processo de homologação do assentamento em uma área que abrangia duas velhas propriedades: Fazenda Portal do Paraíso, desapropriada por motivo de crime ambiental, e Fazenda Santa Fé (Recreio Gleba 3), desapropriada por motivo de improdutividade. Em 2013, o assentamento foi homologado. Na área referente à primeira propriedade, que não teve a desapropriação questionada na Justiça, reside a maioria das 77 famílias, entretanto, 20 delas moram na área da antiga Fazenda Santa Fé, cujo ex-proprietário, o latifundiário e industrial Jorge Ivan Cassaro, não aceita a desapropriação e reivindica na Justiça a posse da terra.

Jorge Ivan Cassaro é originário de Jaú (SP), onde se localiza a planta industrial de sua empresa, a Mundial Paper Ltda., uma das maiores do país no ramo de produção de embalagens plásticas e de outros materiais. A empresa foi fundada em 2001, mas Cassaro já era um notório proprietário de terras desde antes, possuindo muitas propriedades fundiárias em Jaú e outras cidades do interior de São Paulo. Cassaro também tentou ganhar um espaço na estrutura burocrático do velho Estado brasileiro, tendo sido candidato a Deputado Federal em 2014, e a prefeito de Jaú em 2016, ambos pelo PEN. Na ocasião de sua campanha para prefeito, teve sua candidatura impugnada por “abuso de poder econômico”.

O poder econômico de burgueses e latifundiários, é sempre bom frisar, não deixa de significar sempre uma série de abusos contra os trabalhadores da cidade e do campo. Nesse caso em específico temos mais uma confirmação desse fato, uma vez que, conforme denunciam os camponeses do assentamento Luiz Beltrame, Cassaro continua utilizando suas influências políticas e poder econômico para pressionar figuras do poder Judiciário para garantir e acelerar decisões em seu favor. Ao mesmo tempo, o INCRA, que supostamente representaria o lado dos camponeses nas disputas judiciais, também é denunciado pelos assentados por sua imobilidade, levantando também suspeitas de interferências por parte do antigo proprietário.

É óbvio que independentemente da influência direta que pode – e é provável que de fato esteja – sendo exercida pelo antigo proprietário, o Estado brasileiro tende sempre a defender os interesses dos grandes empresários e proprietários de terra. Isso inclui o próprio INCRA, que ao mesmo tempo que participou da criação de uma limitada política de assentamentos nas últimas décadas, atuou para atrasar ou mesmo inviabilizar expropriações mais amplas e audaciosas, e nunca teve o objetivo de realizar uma verdadeira Reforma Agrária, uma que seja capaz de extinguir a aberração histórica que representa o latifúndio brasileiro. Em nossa atual conjuntura, em que o Estado brasileiro cada vez mais abandona suas vestes “democráticas” e rejeita até mesmo as mais tímidas concessões para as classes populares, o INCRA e outros instrumentos de contenção das lutas camponesas são postos de lado, restando apenas a sempre presente criminalização e repressão física daqueles que lutam pela terra.

Ivan Cassaro, que durante a campanha presidencial de 2018 se filiou ao PSL, partido que elegeu o proto-fascista Jair Bolsonaro, sabe que existe uma tendência de ataque frontal aos movimentos camponeses por parte do Estado. Toma proveito da ocasião para retomar os processos contra o assentamento Luiz Beltrame e utiliza de sua influência política e econômica para garantir que seus interesses sejam atendidos, em detrimento das famílias que a mais de 7 anos moram e produzem naquelas terras.

O argumento utilizado por Cassaro no processo em questão é que o solo daquela área seria supostamente impróprio para o plantio, além de próxima de reserva ambiental, o que inviabilizaria o assentamento. A informação não procede, uma vez que, de acordo com dados trazidos pelo MST, o assentamento produziu só no ano de 2018 300 toneladas de mandioca pré-cozida, 5 mil caixas de maracujá, 200 sacas de feijão orgânico, 50 mil dúzias de milho verde, 2 mil caixas de quiabo, 8 mil toneladas de manga, e vendeu 100 cabeças de gado, além de outros produtos hortifrutigranjeiros que não foram contabilizados pelas famílias, produzidos para consumo próprio e para comercialização de excedentes. O assentamento também é exemplo de produção agroecológica e no Sistema de Agrofloresta (SAF), técnicas de produção que dispensam ou reduzem drasticamente o uso de agrotóxicos e o dano ambiental de modo geral. Membros do assentamento inclusive costumam prestar apoio e dar cursos de formação sobre essas técnicas para outros acampamentos e assentamentos camponeses do Estado de São Paulo. A produção e demais atividades do assentamento Luiz Beltrame são responsáveis por fornecer alimentos saudáveis e dinamizar a economia de uma série de pequenas cidades da região, como Ubirajara, Duartina, Garça, Alvinlândia, Lucianópolis e Gália. Também possui um sistema de venda de cestas de alimentos orgânicos em cidades maiores, como Marília e Bauru, em parceria com universidades e sindicatos. O assentamento também foi responsável pela produção de uma série de benfeitorias na área reivindicada pelo ex-proprietários e nos seus arredores, algumas poucas com financiamento estatal, mas a maioria por iniciativa e empenho dos próprios assentados. Nada disso convenceu os três desembargadores da 1ª Turma do TRF-3, que de um belíssimo prédio espelhado na Avenida Paulista, decidiram, por unanimidade, em favor de Ivan Cassaro.

Os latifundiários estão utilizando o Estado, que afinal sempre lhes defendeu e serviu, para conduzir uma guerra aberta contra os camponeses pobres e médios. Há tempos estamos denunciando a escalada de criminalização e sobretudo de repressão militar contra o campesinato dos quatro cantos da nação.

O caso do assentamento Luiz Beltrame é mais um episódio dessa brutal escalada. Despejar essas famílias e deixá-las à míngua em meio a uma crise sanitária não é menos do que um abjeto crime de guerra contra todos os camponeses de nosso país. Que esses mesmos camponeses possam organizar a sua resistência e mobilização política nas bases que tal situação exige.

Nós do NOVACULTURA.info e da União Reconstrução Comunista nos solidarizamos e nos colocamos à disposição dos camaradas do assentamento Luiz Beltrame, com quem já realizamos atividades conjuntas no passado e pelos quais temos profunda estima.

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