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"Manifesto por uma poesia revolucionária e internacionalista"


Em 1993, Amiri Baraka, poeta negro comunista dos Estados Unidos, se encontrou com Ludo Martens, dirigente marxista-leninista belga, em um festival de poesia em Eindhoven. Ao discutirem questões gerais sobre estética e arte, decidem lançar o Manifesto por uma Poesia Revolucionária e Internacionalista, visando combater a hegemonia da arte burguesa, no contexto logo após as grandes contrarrevoluções ocorridas com a queda da URSS e das Democracias Populares do Leste Europeu:

A poesia ainda tem um futuro dentro de um mundo em que no momento voam aviões invisíveis, que caem bombas “inteligentes”, onde os valores humanitários servem como bandeira branca para agressões e massacres, onde embargos, com mãos de ferro, estrangulam crianças e onde os ódios racistas e nacionalistas provocam massacres em série?

Talvez. Ela entra em uma condição que cai na clandestinidade, que vive nas sombras, nas florestas.

Uma condição que faz a poesia invisível para os homens das bombas “inteligentes” e que se funda em verdadeiros homens.

Nós não falamos em nome da poesia. Como o lutador da resistência não pode falar em nome do fuzil. O fuzil do guerrilheiro é a antítese do fuzil do Rambo. Nossa poesia é a antítese das canções que iluminam as noites de um sistema criminal.

Os poetas serviçais oferecem o tom da democracia e da liberdade, mas os verdadeiros poetas são forçados a falar de terror e de morte. À medida em que os burgueses exaltam com maior pompa seus valores universais, o planeta se divide em dois mundos mais irremediavelmente hostis.

Aquele que quiser versar em nome dos interesses dos oprimidos, melhor se manter em guarda. Sua lucidez política deve preceder seu lirismo, e por trás dessa justa combinação, se pavimentará o caminho para um futuro socialista.

É o poeta revolucionário e internacionalista.

Ele é poeta e nada que é humano lhe é estranho

Ele vagueia entre o nascimento e a morte, entre o amor e a amargura, entre a esperança e a derrota, entre a fraternidade e a solidão.

No entanto, ele não compartilha nenhum sentimento, nenhuma sensação, nenhuma reflexão entre essas outras pessoas que aplaudem a Operação Tempestade no Deserto, que retratam o desembarque na Somália, que fecham as fronteiras diante dos refugiados “econômicos” em farrapos e que transformam o trabalho em suplício.

O piloto que bombardeia Bagdá e entra em êxtase diante da beleza alucinante dos fogos de artifício sobre a cidade, é um poeta. Mas ele não é dos nossos. Nós estamos, sinceramente, com o poeta iraquiano que, naquele mesmo momento, traduz o horror em versos, mas cuja poesia vai pertencer durante muito tempo sujeita ao embargo.

Ele sabe que os direitos humanos do escravo não são exatamente os mesmos daquele que estala o chicote.

Ele é um poeta e submete a linguagem a seus caprichos

Ele forma e deforma a linguagem, os arranjos dos sons e lhes impõe as extravagâncias, revela o sentido das palavras a fins de então reinventá-las. Mas em um mundo desumano, ele não prega nenhum absurdo e não aspira a nada. Ele tem coisas a dizer.

Ele não hesita em renovar as formas da poesia. Sua fantasia penetra todas as formas e todas as tecnologias de ponta se curvam à sua visão. Mas em sua forma mais excêntrica, ele fala em nome dos pobres de quem ele é órfão.

Ele é poeta internacionalista e um mundo de sofrimento e esperança vive em seu coração

Em um planeta encolhido à dimensão de uma cidade, as comunicações abolem as distâncias, os transportes transformam todos os homens em vizinhos. O capitalismo de agora em diante espia suas presas no mapa-mundi, pronto para atacar, em um instante, qualquer região que tiver matéria prima para roubar, mão de obra barata para explorar, mercados para conquistar. O capitalismo prega o novo evangelho do dever da intervenção humanitária e mantém suas forças de rápida intervenção a seis horas de distância do canto mais remoto da terra. As multinacionais, o FMI, a máfia e a CIA tem seus quartéis-generais no Ocidente e seus tentáculos estendidos sobre os cinco continentes. A corrupção dos déspotas locais na Ásia, África e na América Latina é o claro reflexo da corrupção dos tiranos ocidentais.

O poeta internacionalista, de onde quer que ele venha, fala o dialeto de Paris e de Berlim, de Londres e Nova Iorque como de Tóquio, como é para o professor desempregado de Paris, o funcionário com salário reduzido de Berlim, os sem-teto de Londres, o desempregado doente de Nova Iorque ou para o operário faminto de Tóquio.

E no dialeto universal, ele descreve, em tudo, o destino de um bilhão de homens trêmulos à beira da inanição, ele pinta a agonia de centenas de milhares de crianças e jovens privados de remédios, ele descreve o inferno da miséria, do analfabetismo, do obscurantismo, da vida sem dignidade e sem futuro, que é o destino de centenas de milhões de homens na África, Ásia e América Latina. O poeta internacionalista ensina a todos tudo que há, nestas democracias de conquistadores e de fantoches, a venda de órgãos humanos, a prostituição infantil e a exploração dos escravos.

O poeta internacionalista não tem nenhuma consideração para seu irmão-inimigo na cabeça de Jano, este poeta cosmopolita viajando em "classe executiva" ao redor do mundo, sendo pago para cantar a cultura burguesa de todos os continentes e de todas as nacionalidades. O poeta da corte é a boa consciência de Clinton e de Ramos, de Miterrand e de Mobutu, de Kohl e de Perez, de toda essa liga internacional de sanguessugas.

De perto, o poeta cosmopolita porta no pescoço o colar da morte do chauvinismo. Se necessário, para agradar seu soberano, em cada país, em cada região, em cada província, ele vai afundar seu rosto na areia do racismo, obscurantismo e do anticomunismo.

Ele é o poeta internacionalista e revolucionário. Sob sua pena, se rompe uma sociedade imunda e nasce um mundo novo.

Poeta revolucionário, ele sabe o que torna a arte execrável. Ele sabe o objeto de sua raiva destrutiva.

Execrável, é essa cultura cuja soma se chega a bilhões de dólares. Execráveis, essas séries policiais e esses filmes transbordando originalidade num quadro burguês mesquinho, tal como essas músicas pobres que as multinacionais produzem, com os olhos voltados somente para os lucros. Comendo com as mãos criminosas, lambendo as botas que voltam da guerra, o poeta-mercenário produz obras que deixam os homens limitados, idiotas e egoístas.

Execrável é essa arte pela arte, elitista e hermética, que dá à burguesia um semblante de cultura e os reafirma dentro de seus atos infames. A arte pela arte realiza aquilo que jamais existiu no mundo humano. Em relação aos outros, essa arte é feita de irresponsabilidade, covardia e cumplicidade de culpa.

Execrável é essa poesia engajada com os ricos

O que eles não fizeram, esses ricos, contra a nossa arte engajada, a arte utilizada a fins políticos, a arte do realismo socialista!

Mas mal eles arrancaram a arma de nossas mãos, eles se voltaram contra nós. Eles nos combateram em nome da liberdade do artista. Mas os ricos, que libertaram seus poetas de todo ideal social, os engajaram na luta contra o povo e o socialismo. Os burgueses cuspiram no realismo socialista para melhor glorificar o realismo antissocialista. Soljénitsyne, admirador do czarismo, simpatizante dos nazistas, colaborador da CIA, lançou no mercado seu realismo contrarrevolucionário que, sem atraso, foi popularizado com vários prêmios Nobel e diplomas honoris causa. A. Valladares, esse policial desprezível que foi preso em Cuba, recebeu ordens da CIA para escrever poemas que foram imediatamente difundidos em todo o mundo como a obra-prima da arte anti-totalitária. O poeta Valladares agora é alto funcionário do Departamento de Estado. Ele não precisa mais fingir escrevendo poesia, ele escreve sem rodeios suas acusações contra o socialismo.

O poeta revolucionário, ele sabe que faz arte humana. Ele se arma com fortes palavras que explodem como granadas no rosto das classes exploradoras.

Não há humanidade fora do compromisso com os oprimidos e explorados, fora da ligação com os operários, camponeses, os trabalhadores que sofrem com uma ordem injusta e insuportável, fora da unidade sincera com os combatentes e militantes que enfrentam o imperialismo e o capitalismo. Imperialismo e capitalismo, lembrem bem dessas palavras, queridos irmãos-inimigos. Um poeta teve de reinventar as palavras que vocês baniram do dicionário por crime de linguagem estereotipada.

Não existe revolução fora da tradição revolucionária

Spartacus foi derrotado contra o Império Romano, mas hoje nós honramos a sua memória lutando contra os impérios do presente. A União Soviética construiu pela primeira vez em dez mil anos da história humana, uma sociedade onde as classes oprimidas impuseram seus ideais, seus interesses, a sua vontade aos exploradores. O socialismo fez surgir da estepe os complexos industriais, enviou os filhos e filhas de analfabetos para a universidade, recitou poesias diante das grandes fornalhas e dos campos de concentração, sangrou até a morte a besta imunda do fascismo alemão.

Desde 1917, o velho mundo organizou seus torturadores e carcereiros, todos os bispos e filósofos, todos seus generais e banqueiros, todos seus saltimbancos e poetas. Ademais, a construção socialista ia avançando e com mais clareza a burguesia mundial viu a morte rondar sua vizinhança. A velha sociedade esperneia ferozmente com raiva.

Mas na União Soviética, o desgaste da guerra, dirigentes do Partido, engenheiros, gestores, professores e poetas, todos os comércios já haviam anunciado sua vitória irreversível. Ao dormir sobre os louros, eles foram lentamente anestesiados ou sufocados lentamente. O inimigo era mais forte, mais pérfido, mais cruel e bárbaro que os humanos imaginavam.

O poeta revolucionário toma o cuidado de resgatar dos escombros o que foi desenvolvido na literatura e na lírica das antigas sociedades socialistas. Ele vai salvar da lama e desembaraçar os melhores poemas do mundo socialista e dar-lhes uma nova vida para um novo combate.

Porque o socialismo é o futuro da humanidade

Que hoje somente os lobos tenham direito à palavra não muda em nada essa verdade. A velha máxima de que o homem é o lobo do homem não marca o fim da história. Um dia, a humanidade sofrida vai acabar com a propriedade privada dos centros nervosos da sociedade. Essa propriedade privada que permite, na maior legalidade, a fome e a asfixia, o envenenamento e a mutilação, para levar à insanidade e à morte. A propriedade social das principais alavancas da sociedade constituirá a base dos valores coletivistas e dos princípios de solidariedade e de fraternidade entre os trabalhadores.

O socialismo será a vitória dos humanos contra os lobos disfarçados de democratas. A voz aos sem voz! Nas próximas dez gerações, os lobos usarão uma focinheira de ferro.

Nesta terra cada vez menos habitável, temos um mundo a ganhar.

Sobre os escombros de uma civilização bárbara, temos um mundo humano a construir.

O poeta revolucionário e internacionalista contribui com sua modesta pedra.

Amiri Baraka e Ludo Martens

Traduzido por Gabriel Duccini

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HISTÓRIA DAS
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