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"História e Classes Sociais"


O ensino de história encobre os interesses da classe dominante expostos como valores eternos da nação. Isto ocorre particularmente nos países coloniais. Sarmiento será para a oligarquia vitoriosa um arquétipo, porque seu conceito de “barbárie” implica na imediata negação das massas na história. Inversamente, se a classe trabalhadora pudesse elevar-se subitamente à consciência histórica, designaria Sarmiento como inimigo, enquanto os caudilhos seriam os antecedentes necessários de sua própria luta como classe nacional. Contudo, nada mais que um prolongamento. Porque a luta das massas não se inspira nos melancólicos funerais póstumos dos guerrilheiros do século XIX, mas na revolução latino-americana deste século. Quando a historiografia dos vencedores é julgada diante do tribunal da história, por grupos intelectuais portadores de consciência nacional e tal atitude coincide com a maturidade política de um povo, pode predizer-se que o poderio da classe dominante periga, porque todo o pedestal da história oficial, instauradora desse predomínio de uma classe, desaba. Não se trata de um mero litígio de discussão cultural. Esta antítese cultural é apenas um derivado do processo de industrialização que afasta a antiga classe dominante do poder político. Assiste-se, como na Argentina atualmente, às tentativas da oligarquia, ainda poderosa, de rejuvenescer seus mitos decrépitos, criados para impedir que a Argentina siga outro destino que o que sempre teve: os frutos da terra. O pensamento da oligarquia corresponde ao retrato feito por Marx, ainda que de maneira muito genérica, da nobreza feudal europeia, ameaçada pela era industrial: “O latifundiário sublinha a nobre linhagem de sua propriedade, as recordações feudais, as reminiscências, a poesia da lembrança, o seu caráter generoso, sua importância política, etc. E quando fala em termos econômicos afirma que unicamente a agricultura é produtiva. Ao mesmo tempo, retrata o seu oponente como um indivíduo astuto, aproveitador, enganador, mercenário, rebelde, sem coração e sem alma, um velhaco violento e mesquinho, servil, adulador, lisonjeiro, seco, sem noção de honra, princípios, poesia ou qualquer coisa semelhante, alienado da comunidade com que negocia livremente e cuja competência fomenta, alimenta e ama a pobreza, o crime e a dissolução de todos os vínculos sociais” [1]. A crítica à cultura da oligarquia não é gratuita. É uma das armas que deterioram sua preponderância política e um passo prévio para a reforma educacional, necessária à destruição da imagem de uma Argentina agropecuária, inculcada, pelo sistema escolar, a muitas e muitas gerações de argentinos. Esta cultura é uma pequena fração do domínio imperialista. Disso é fácil concluir que nos momento que antecedem à libertação de um povo, a consciência histórica, por seus mais autênticos escritores, apresenta uma face dupla: de um lado, o conhecimento do passado e, de outro, uma consciência revolucionária atual, ou seja, o racional estruturamento, com o futuro da nação, que não implica em quebra histórica, mas em processo pelo qual a inteligência nacional retorna ao passado não para extasiar-se com a idade de ouro da classe dominante, perdida para sempre, mas para superá-lo, tomando desse passado, emudecido pela oligarquia, os elementos vivos do povo, que fortalecem as exigências revolucionárias do presente. Tal consciência histórica não propõe desfazer-se do passado, mas apropriar-se dele, já que a negação do passado representaria secar as fontes da comunidade nacional nas suas tendências mais espontâneas e profundas, onde a população vai buscar o próprio alimento cultural. Ao passado da oligarquia o espírito revolucionário opõe o passado real, despido de ideal romântico e o exibe à luz dos privilégios de uma determinada classe. Essa consciência histórica, segura de si mesma, tende a identificar-se com os valores soterrados da vida do povo. A consciência histórica refuta o passado que uma classe em declínio pretende manter em vigência, mesmo contra o desenvolvimento nacional, e situa essa classe, agora antinacional, na totalidade da história argentina. A consciência histórica percebe perfeitamente que: “Todas as fases históricas não são mais que etapas sucessivas na marcha da evolução e progresso humanos. Cada fase é necessária e portanto legítima para a época e circunstâncias às quais deve sua existência, ainda que seja ultrapassada e perca a razão de ser, face às novas condições de consciência que amadurecem vagarosamente em seu próprio seio”. (Hegel). A consciência histórica não nega a oligarquia como passado. Nega-a como presente. E estuda as causas que concorreram, desde o ano passado, para a gradual decadência em que se encontra nos dias de hoje. A autonomia cultural defendida nos escritos dos pensadores representativos da unidade nacional floresce sobre os ensaios de independência econômica, ou melhor ainda, nos períodos que antecedem tendências libertárias, enquanto que, nestas etapas, recrudesce a defesa da cultura europeia contra as reivindicações da nativa, da parte dos intelectuais subordinados à oligarquia, verdadeiros beócios culturais na medida em que negam a cultura nacional em nome da cultura estrangeira. Trecho da obra “O que é o ser nacional?”, publicada originalmente em Buenos Aires (Argentina) no ano de 1963. Escrito por Juan José Hernandez Arregui Nota [1] Não se trata de um retrato exagerado. O órgão representativo da classe latifundiária argentina, La Nación, abusa de expressões dessa consciência de classe, aliada ao desdém sub-reptício para com o povo. Eis um exemplo digno e desagradável desta literatura: O sol cai quase a prumo sobre o pequeno agrupamento de vitelos que os peões limpam com afã. A plaina passa por onde o vaporizador deixou pequeníssimas pérolas que refletem a luz e os pelos brilhantes são reunidos com arte primorosa. O futuro autor da próxima batalha de consagração está alheio a tudo que a ele se refere, à sua volta, imóvel, como adormecido. Para todos a faina já está pronta. Para todos, menos para o minucioso peão. De um golpe de vista rápido encontrou algo que a seu ver é demais . Uma mecha. Tesoura em punho e arremete-se contra o indesejável “cochilo” em sua obra e a deixa perfeita. Toma o cabresto, faz levantar a cabeça do seu pequeno touro e avança com ele para a pista. No chão, como lembrança de sua batalha pela estética, permanecem inutilmente encrespados os restos da mecha colorida”. (La Nación, 10/05/63)

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