Trinta Anos do Partido Comunista da China (Hu Qiaomu)
APRESENTAÇÃO
Nós, do selo Edições Nova Cultura, criado pela União Reconstrução Comunista, apresentamos ao público brasileiro o livro Trinta Anos do Partido Comunista da China, escrito por Hu Qiaomu (importante intelectual que ocupava o posto vice-diretor do Departamento de Propaganda do Partido Comunista da China) em 1951. A leitura deste livro, sucinta e objetiva, certamente dará ao leitor o conteúdo básico sobre o desenvolvimento da história da Revolução Chinesa e do Partido Comunista da China, desde sua fundação até a conquista do poder político em todo o país em outubro de 1949, incluindo o período inicial da construção do socialismo, quando o Partido se deparava ante as tarefas democráticas anti-imperialistas e antifeudais da Revolução Chinesa, anteriormente à etapa da passagem para a edificação socialista.
Nos dias de hoje, após muitas décadas de predomínio absoluto do revisionismo, do reformismo e do oportunismo no seio do movimento popular brasileiro, após as muitas décadas de degeneração do Partido Comunista do Brasil – o partido de vanguarda da classe operária brasileira – até sua completa liquidação durante os anos 80, o movimento comunista em nosso país encontra-se em frangalhos, com a Revolução Brasileira carecendo de um genuíno Partido de vanguarda que a dirija para um caminho correto até sua completa vitória. Quanto a esta necessidade, há em todo o Brasil concepções confusas e ecléticas sobre o problema, com a predominância da visão equivocada segundo a qual não será necessário um Partido Comunista para dirigir Revolução Brasileira. Mesmo entre a parcela do movimento popular brasileiro para a qual o Partido Comunista necessita ser reorganizado e reconstruído, há a carência das verdadeiras referências ideológicas necessárias para sua reorganização. Qual será a base ideológica que dará a linha condutora no processo de reorganização, reconstrução e construção do novo Partido Comunista do Brasil? Sob quais referências no exterior devemos nos espelhar para reorganizar este Partido? Quais experiências da luta do proletariado brasileiro e internacional nos possibilitarão tirar lições mais precisas sobre como dirigir a Revolução em nosso país? Qual o papel do Partido no processo da Revolução brasileira e na construção do socialismo? Qual o caráter da sociedade brasileira? Em qual etapa a Revolução brasileira se encontra em nossos dias? Para tais perguntas as mais diferentes organizações dão diferentes respostas, de modo que a conquista da unidade no movimento popular brasileiro ainda é algo que necessita ser exaustivamente trabalhado em torno de princípios concretos.
Foi sob a iniciativa de buscar respostas para algumas de tais perguntas que traduzimos esta importante obra, sobretudo na busca por quais devem ser nossas referências no exterior, nossas inspirações para levarmos a cabo a Revolução Brasileira, bem como qual deve ser nossa ideologia guia, que em nossa visão, a visão da URC, deve ser o marxismo-leninismo e o Pensamento Mao Tsé-tung. Os ensinamentos da aplicação criativa do marxismo-leninismo à realidade chinesa pelo Partido Comunista chinês, com o camarada Mao Tsé-tung a frente, são fundamentais para desenvolver o movimento revolucionário em nosso país. Foi com o objetivo, também, de fornecer aos operários, camponeses e intelectuais revolucionários brasileiros os conteúdos básicos da história do Partido Comunista da China e da Revolução Chinesa que este trabalho foi realizado.
Antes de o leitor se iniciar no estudo da obra presente, faremos uma breve apresentação inicial sobre a história do Partido Comunista da China e da Revolução Chinesa.
O Partido Comunista da China foi fundado no ano de 1921 como a vanguarda Marxista-Leninista da classe operária chinesa. A fundação do Partido se deu em um contexto no qual a China então se configurava como um país semifeudal e semicolonial, submetido à dura opressão das potências imperialistas estrangeiras que então a dividiam em “esferas de influências”, “áreas de arrendamento” e “concessões”. Refletindo as lutas interimperialistas entre as potências estrangeiras na arena internacional, os diferentes países imperialistas se apoiavam em diferentes frações das classes dominantes chinesas, como a burguesia compradora e a classe latifundiária, para levar a cabo guerras fratricidas pela conquista de mais territórios e áreas de influência dentro da China. Tal lamentável situação passou a existir na China partir da década de 40 do século XIX, quando, após a primeira Guerra do Ópio, deixou de ser um país feudal isolado e relativamente independente para se tornar semicolonial e semifeudal, dependente das potências estrangeiras. No processo da luta revolucionária contra as potências imperialistas estrangeiras e as forças feudais e latifundiárias domésticas, o Kuomintang, representante da burguesia nacional chinesa de tendências patrióticas e anti-imperialistas, levou a cabo a Revolução democrático-burguesa de 1911, derrubando a dinastia dos Qing, lacaia das potências estrangeiras, e estabelecendo na China uma república democrático-burguesa. O estabelecimento, na China, de uma república democrática ao estilo ocidental não significou, contudo, a conclusão de uma revolução democrático burguesa no país. O imperialismo estrangeiro permanecia mais forte do que nunca na China, controlando setores estratégicos e essenciais da vida econômica do país; não se realizou qualquer reforma agrária no campo e as forças feudais permaneciam ainda mais fortalecidas após a conquistas de enormes extensões de terras em guerras interfeudais; a burguesia nacional permanecia impedida de desenvolver sua produção por conta da opressão estrangeira e feudal e a classe operária e o campesinato padeciam sob absoluta miséria, sob o atraso e a fome. Em diversas regiões do país, poderosos latifundiários progrediam no processo de restauração do regime monárquico feudal, como o caso de Yuan Shikai que se autoproclamou im¬perador após restaurar a monarquia nas províncias do norte do país. Greves operárias, revoltas camponesas e manifestações estudantis contra o imperialismo estrangeiro sacudiam todo o país, com os históricos levantes populares como o Movimento Quatro de Maio em 1919.
Em tal época, desde sua fundação em 1921, o Partido Comunista da China aplicava a política de cooperação com o Kuomintang e outras forças patrióticas, inclusive destacando quadros históricos seus (Mao Tsé-tung chegou a fazer parte do Comitê Central do Kuomintang) para realizarem o trabalho político Marxista-Leninista dentro das fileiras do Kuomintang e do exército nacionalista que este dirigia. O Kuomintang, que durante os anos 1920 passou a formar o Exército Expedicionário do Norte para combater as forças feudais que restauravam a monarquia no norte do país, contou com a formidável cooperação dos comunistas na luta armada contra os restauracionistas. Contudo, a partir de 1927, quando os representantes do imperialismo estrangeiro (principalmente estadunidense) no seio do Kuomintang, unidas em torno do cau¬dilho reacionário Chiang Kai-shek, dão um golpe de Estado contra o governo nacionalista e passam a dirigir um sangrento massacre contra o Partido Comunista da China e outras forças populares, a atuação do Partido passa por consideráveis mudanças. Como resposta ao golpe dado por Chiang Kai-shek, os comunistas liderados por figuras como Chu En-Lai, Chu Teh e Liu Bocheng, levam a cabo no mesmo ano, a insurreição urbana conhecida como Levante de Nanchang, mas que acabou por sofrer uma considerável derrota militar neste levante, tendo que reergueu suas forças através de uma retirada estratégica para as montanhas de Jingam, unindo a parte do Exército nacionalista que permaneceu então sob a direção do Partido Comunista da China às guerrilhas rurais que há algum tempo já atuavam sob a direção de Mao Tsé-Tung. Não apenas a atuação do Partido Comunista da China neste período passa por consideráveis modificações, como também se modificam determinadas características da Revolução Chinesa. Esta, que mantinha seu caráter inegável de uma revolução democrático burguesa dirigida contra o imperialismo e o feudalismo interno, permanecia até 1927 sob a direção da burguesia nacional organizada no Kuomintang. A partir de então, com a passagem do Kuomintang para a reação (deixando de ser um partido nacionalista e progressista para se tornar um representante da burguesia compradora e do imperialismo), a classe operária (organizada no Partido Comunista da China) se torna pela primeira vez a força dirigente da Revolução Chinesa, levando a cabo uma sólida aliança com as centenas de milhões de camponeses chineses e com demais forças democráticas e patrióticas das regiões urbanas e rurais. Se inicia então, a partir do ano de 1927, o período da Segunda Guerra Civil Revolucionária, onde, ao contrário da política de cooperação com o Kuomintang, o Partido Comunista da China pas¬sa a a¬tuar como a única força dirigente da Revolução democrática chinesa, ganhando o campesinato e outras forças patrióticas para a luta contra o Kuomintang que, a partir de então, passa a representar as velhas classes dominantes, a burguesia compradora, os latifundiários, e o imperialismo.
O Partido Comunista da China, que dirigia o Exército Vermelho de Operários e Camponeses na luta armada rural, acumulou consideráveis experiências durante a Guerra Civil Revolucionária contra o Kuomintang a partir de 1927 e resistiu bravamente aos longos períodos de reação e repressão generalizadas contra os comunistas e as forças democráticas chinesas. O período da Segunda Guerra Civil Revolucionária é marcado por formidáveis acontecimentos na arena doméstica e internacional: a partir de 1931, o Japão, que havia emergido como uma poderosa potência imperialista no Oriente, invadiu a região da Manchúria, no nordeste chinês, transformando esta região no Império de Manchukuo, uma colônia sua em território da China; a ascensão do fascismo na Europa e a gradual passagem do Japão para o eixo das forças nazifascistas. Porém, no seio do Partido Comunista da China predominavam linhas oportunistas de tipo esquerdista que impediam o avanço do trabalho político partidário a partir das novas condições históricas trazidas pelos acontecimentos de 1931. Os representantes de tal linha oportunista advogavam a inexistência de quaisquer mudanças fundamentais na situação política nacional mesmo após a invasão do imperialismo japonês. Tal linha política considerava o imperialismo japonês e as camadas médias nacionais como igualmente reacionárias, impondo sobre o Partido o slogan de se "atacar a tudo e a todos". A linha esquerdista no seio do Partido sofreria duras derrotas a partir da Conferência de Tsunyi em 1935, quando o Presidente Mao Tsé-tung emerge então como o principal líder do Partido Comunista da China, colocando a Revolução Chinesa no correto caminho da construção de uma Frente Única Nacional, com a participação de todas as forças que se opunham ao imperialismo japonês. A partir do ano de 1937, quando o Exército imperial japonês ataca as grandes cidades de Pequim e Xangai, a Revolução Chinesa ingressa no período da Guerra de Resistência contra o Japão. Durante a Guerra de Resistência, quando se delineavam o povo, o Kuomintang e os traidores como os três únicos setores da sociedade chinesa, se amplia consideravelmente a base social para o trabalho político do Partido Comunista da China na luta contra o imperialismo japonês. A partir daí o Partido Comunista da China realiza um chamado pelo fim da Guerra Civil e pela união nacional para resistir à invasão japonesa. O Partido Comunista e o Kuomintang voltaram a cooperar entre si sob as novas condições históricas.
A invasão da China pelo imperialismo japonês coincidiu com a eclosão da Segunda Guerra Mundial. A nível internacional, a correlação de forças apresentava de um lado, a União Soviética e as potências imperialistas aliadas (Estados Unidos, França e Inglaterra) que se colocam ao lado da luta antifascista e, de outro, as potências imperialistas nazifascistas, Alemanha e Itália ao lado do Japão. Tal correlação de forças a nível internacional influenciava diretamente o prosseguimento da revolução chinesas.
Uma vez que o Kuomintang era um partido que representava principalmente o imperialismo norte-americano, tratava-se de uma força política cujos interesses entravam em contradição com o imperialismo japonês, uma vez que a colonização da China pelo Japão prejudicaria os interesses estadunidenses. Desta forma, ainda que de maneira limitada, inconsequente e, na maioria das vezes, sabotadora, o Kuomintang se configurava como uma força política capaz de se opor ao imperialismo japonês e, portanto, deveria ser conquistada para a Frente Única Nacional Antijaponesa. Tal como fez o imperialismo estadunidense e anglo-francês na relação com o renascimento imperialismo fascista alemão, na China o Kuomintang adotou a política da “resistência passiva” ao imperialismo japonês, da feita que, se lhes incomodavam o avanço do imperialismo japonês sobre as atividades econômicas norte-americanas e europeias, lhes incomodava ainda mais o Partido Comunista. A política de ofensiva contra o Partido Comunista e de resistência passiva ao Japão enfraquecia as fileiras das forças antijaponesas e criava condições objetivas para o fortalecimento das posições do imperialismo japonês. As atitudes traidoras e conciliadoras do Kuomintang levavam à crescente perda do prestígio deste ante as massas populares. Caíam por terra as ilusões daqueles que ainda imaginavam que este partido poderia ainda vir a ter uma postura realmente patriótica e combativa. O prestígio do Partido Comunista, ao contrário, crescia a cada dia e o povo chinês passou a gradualmente a enxergá-lo como a força política mais consequente na luta contra o imperialismo japonês e que representava concretamente os interesses fundamentais da nação chinesa. Atesta este fato o enorme crescimento Exército Popular de Libertação, que cresceu para um gigantesco de efetivo de 3 milhões combatentes, entre os 910 mil combatentes efetivos e o contingente de 2,2 milhões de combatentes organizados nas milícias populares, ocupando-se simultaneamente da defesa e da produção, no ano de 1944. A tal altura, o Partido Comunista já havia libertado extensas partes do território chinês, com cerca de 95 milhões de pessoas vivendo em suas bases de apoio.
A vitória da grande União Soviética na guerra antifascista no ano de 1945, bem como a capitulação do Japão na guerra foi um fator que influenciou positivamente não apenas a luta libertadora dos povos de outros países como também do povo chinês. A derrota do Japão e a libertação da China da dominação do domínio do imperialismo japonês, assim, fez a Revolução Chinesa entrar em um novo estágio, a Terceira Guerra Civil Revolucionária.
A decadência japonesa não significou a completa libertação da China da dominação imperialista estrangeira. O povo chinês padecia sob a dominação dos imperialistas estrangeiros, das forças feudais e dos grandes capitalistas burocráticos ligados ao Kuomintang. O imperialismo norte-america¬no, que e¬mergia na arena internacional como a principal potência imperialista do mundo e levava a cabo sua política reacionária de "Guerra Fria" contra a URSS e os países de democracia popular, manifestava seu interesse em se apossar dos mercados chineses, de sua mão de obra barata e de suas extensas terras. O Kuomintang, na China, apresentava-se como a mais submissa força política a tais interesses. Sua já impopularidade adquirida a partir das posturas adotadas durante a Guerra de Resistência contra o Japão era agravada ainda mais com as políticas antipovo que passou a aplicar durante a época da Terceira Guerra Civil Revolucionária. A inflação subia a níveis alarmantes, que eram até então desconhecidos, por conta das políticas de superemissão de moeda feitas para favorecer aos banqueiros e aos demais burocratas das finanças kuomintangistas. Entre as políticas antipovo praticadas, figuravam também as políticas destinadas ao massacre dos lavradores e assalariados agrícolas chineses. No campo, o Kuomintang passava a aplicar formas primitivas de acumulação de capital a¬través de políticas de confisco de grãos de camponeses e grilagem de vastas extensões de terras para usá-las com fins de especulação imobiliária e obtenção poderes pessoais, levando à ruína completa dezenas de milhões de camponeses das regiões rurais chinesas. Recrudesceu a repressão contra os comunistas e as massas populares. Escancarando sua verdadeira face vende-pátria ao receber armamentos do imperialismo norte-americano para atacar o Partido Comunista da China, o Kuomintang concluía seu profundo colapso político. Nem mesmo a inundação da China com os mais modernos equipamentos e armamentos militares fornecidos pelo imperialismo ou o aporte financeiro do anticomunismo, foram suficientes para deter o crescente prestígio do Partido Comunista entre o povo chinês, que emergiu vitorioso na Terceira Guerra Civil Revolucionária, constrangendo o Kuomintang e seu exército à capitulação completa, libertando a China e fundando a República Popular da China em 1º de outubro de 1949. A partir de então, o Partido Comunista da China e o povo chinês, após a conquista do poder político pela classe operária e aliados, passaram a se confrontar com a conclusão das tarefas políticas de conteúdo anti-imperialista e antifeudal, como a conclusão da reforma agrária, a superação do a¬traso econômico e a industrialização nacional, para assentar as futuras bases para a construção da sociedade socialista.
Esperamos que a obra que agora publicamos possa cumprir a função de propagandear a gloriosa Revolução Chinesa, a luta travada pelo Partido Comunista da China e os princípios do marxismo-leninismo que o guiaram entre os operários, lavradores e intelectuais revolucionários brasileiros, em suma, a todo movimento progressista nacional.
UNIÃO RECONSTRUÇÃO COMUNISTA
TRINTA ANOS DO PARTIDO COMUNISTA DA CHINA
Tradução inédita da publicação de 1951 do comunista chinês Hu Qiaomu, ex-vice diretor do Departamento de Propaganda do Partido Comunista da China que durante anos trabalhou como um dos principais ideólogos da linha política deste Partido, a obra trata da trajetória de três décadas da luta do PCCh para organizar as grandes massas do povo chinês - os operários e camponeses - contra o domínio das potências imperialistas estrangeiras e das classes dominantes domésticas de capitalistas compradores e grandes senhores de terras. Após o início da Guerra Popular no ano de 1924 em aliança com setores democráticos e patrióticos da sociedade chinesa e, após muitos anos de lutas revolucionárias, a classe operária e o povo dirigidas pelo Partido conquistam o poder em todo o país no ano de 1949, com a conseguinte fundação da República Popular da China.